segunda-feira, 29 de abril de 2013

A questão da morte




A questão da morte

(…) para os indianos a morte é uma questão muito diferente daquilo que é para os europeus.(…) O problema da morte, pelo menos no que se refere ao aspecto formal e ritual, nunca foi solucionado na Europa e muito menos na América. A morte na Europa é uma questão retórica e lúgubre, de uma solenidade enfadonha que mal dissimula o antigo terror. (…) Mas a morte na Índia é leve, simples, filosófica, serena e desprovida de importância, como era, talvez, na antiga Grécia. Contudo, a operação religiosa e psicológica que permitiu esta transformação custou à Índia um preço muito elevado de inadequação à vida social, prática e política. Por isso julgamos que a concepção indiana pode ser compreendida e adoptada por alguém como simples indivíduo; mas que seria perigosa para a sociedade ocidental, que a não poderia aceitar sem se trair a si própria. (…) Estamos dez minutos ou vinte, ou meia hora, a olhar para aqueles homens e mulheres que têm os olhos fixos na fogueira em que arde o seu defunto; e por fim compreendemos que esta indiferença tão estóica não é a da insensibilidade e da frieza, mas sim a da religião, que considera a morte uma simples mudança de vestuário ou invólucro. Naquela fogueira, de acordo com uma frase notória, não se consome uma pessoa única e irrepetível, mas sim um vestido coçado, que já não prestava, uma pele velha que se abandona por outra nova.

In “Uma ideia da Índia” de Alberto Moravia Ed. Tinta da China 2008

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