sábado, 7 de fevereiro de 2015

Grécia: tornar possível o “impossível” (e vice-versa)

Colocados perante o desespero de, numa situação de emergência económica, social e humana, em “estado de sítio”, lhes ser exigido o impossível (“sem alternativa”, cumprirem estritamente as “regras da União Europeia” com uma dívida pública de 320.000 milhões de euros, 175,1% do PIB, com um grego na pobreza em cada quatro, com desumanidades como a fome a grassar e muitos dos desempregados, são 1.400.000, a serem “punidos” com a perda de direito à saúde pública), apesar de toda a chantagem antidemocrática que sobre eles foi exercida pelos “mercados” e pelos guardiões tecnocratas e farisaicos interesseiros (ou subservientes) das “regras” da União Europeia, os gregos foram buscar ao desespero coragem e esperança para acreditarem que é possível tornar possível o que lhes estão a tornar impossível: humanidade.

“Radicalizaram-se”? Sim, foram às raízes da sua História, à Grécia Antiga de há quase 25 séculos, reavivar uma referência radical: “O Homem é a medida de todas as coisas” (Protágoras). O Homem e não o dinheiro, como querem que o seja, por subversão deste pensamento do filósofo, os(as) radicais inumanos e associais do financismo, do neoliberalismo e da tecnocracia. Sim, os gregos (re)afirmaram agora como referência política as raízes (por definição) da democracia: as pessoas, o povo (“demos”) que a via do radicalismo austeritário das “regras” (e como e quando as aplicar) os colocou em descalabro humanitário. 

 Um bom contributo e oportunidade para que, na Europa (e não só), os senhores (e as senhoras) do dinheiro, do poder e das “regras” (e os que, por subserviência ou interesses, lhes reforçam o poder) mudem o discurso, a atitude, as “regras” e as práticas económica, social e humanamente impossíveis.  

Se isso não acontecer, não obstante o cumprimento “á risca” de todas (est)as “regras”, pelo que por aí se está a ver pela Europa fora (incluindo, marcadamente, na Grécia), há o risco de a esses sinais se seguir efectivamente algo tão ou mais catastrófico e (perversamente) “radical” que a última das duas megabarbáries que, no século passado, foi precedida de idênticos sinais.

Ou seja, se os gregos estão a mostrar quererem tornar possível o “impossível”, é avisado que a União Europeia aproveite e (se) reflicta e (se) cuide no sentido de, tanto quanto possível, tornar impossível o que, perversamente, pode ser (de novo) possível.

J. Fraga de Oliveira

(Público, 1/2/2015, página 50)

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