quinta-feira, 23 de abril de 2015

41º ANIVERSÁRIO DE UMA LIBERDADE POR CUMPRIR

Eu tinha quase 11 anos e aquele dia de Abril amanheceu solarengo.

Com o passar das horas o povo foi percebendo o que se estava a passar e como que ateando um rastilho de pólvora doce, o ar foi ficando carregado de euforia, sorrisos e lágrimas antes derramadas em silêncio, agora de peito aberto e orgulhosas.

Naquele dia a Esperança teve um outro sabor e uma outra textura – algo estranha mas carregada de promessas.

Ébrios de uma liberdade que ainda não entendiam, os portugueses saíram à rua como nunca antes tinham saído e como nunca mais voltaram a sair.

Tudo era excessivo, mas tudo era genuíno e só por isso viver o momentos e olhar as imagens que varriam Portugal de norte a sul, teria valido a pena sair à rua e celebrar aquilo que aquele dia de Abril e os outros que se seguiram pareciam prometer.

 A manifestação do primeiro 1º de Maio tem uma importância, histórica, sociológica, sociopsicológica e emocional sem paralelo na história do Portugal Democrático e relembro-a como se fosse hoje porque ainda lhe sinto o cheiro e o sabor, apesar de ser na altura uma gaiata.

Neste dia, ainda que “ressacados” pelos acontecimentos de 5 dias antes e sem saber o que riria acontecer daí para a frente, os portugueses sonharam…sonharam muito e criaram muitas expectativas.

Naqueles dias e nos outros que se seguiram, Liberdade queria dizer Respeito, Diálogo, Trabalho, Educação, Saúde, um país novo e um novo país – em termos de mentalidades, maturidade, responsabilidade e visão de Portugal no mundo.
Naqueles dias tudo era possível…e tudo foi possível naquela explosão de afecto pintada de vermelho e verde; naquele mar de esperança que invadiu a terra e os corações dos portugueses.

Mas…existe sempre um maldito mas…passados 41 anos da Esperança trazida pelo vento de Liberdade trazido por aquele Abril, olhamos em torno de nós, olhamos para o país e vemos  o quê ?, sentimos o quê ?, celebramos o quê ?
Vemos um país triste; sentimos raiva e revolta; celebramos o fracasso do sonho.
Esta é realidade, não vale a pena mascará-la; mas também não podemos baixar os braços e deixar morrer a semente que Abril plantou.

Portugal é hoje um país politicamente mal frequentado e as pessoas sérias receiam ficar contaminadas. Os movimentos de cidadãos começam cheios de garra e rapidamente ganham os tiques dos partidos e ficam iguais a eles, ou morrem e passam a existir em blogues, tertúlias e worshops onde vão fazendo a catarse dos seus desencantos.

Hoje , 41 anos depois de Abril e eu  quase com 52 e filhos bem mais velhos do que eu era na altura ( 20 e 23 anos ), quero falar-lhes da importância deste dia e fico com um nó na garganta, porque sei, porque sinto e vejo que o futuro deles e tão escuro e incerto. Porque sinto e vejo que eles não acreditam no país em que nasceram e com o seu silêncio que tanto fala, nos perguntam – o que foi que vocês deixaram fazer a Portugal.

Teremos nós coragem para lhes responder, com verdade?
Dito isto, volto a dizer o que já repeti tantas vezes – fizemos Abril…mas 41 anos depois, continua a faltar “cumprir Portugal” e os nosso filhos e netos exigem de nós que sejamos capazes, ou pelo menos que tenhamos a maturidade e seriedade suficientes para lhes dar uma explicação cabal para o fracasso do sonho.

Seremos capazes ?...

Graça Costa


2 comentários:

  1. Vou ficar a pensar nisto:
    "Os movimentos de cidadãos começam cheios de garra e rapidamente ganham os tiques dos partidos e ficam iguais a eles, ou morrem e passam a existir em blogues, tertúlias e worshops onde vão fazendo a catarse dos seus desencantos."

    obrigada :)

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  2. Pense minha querida Céu - acredito que não teorizei...passei pela experiência e por muito que me custe, o nosso sistema político está estruturado para em tese incentivar a cidadania e na prática a estrangular não lhe dando espaço nem legitimidade política para intervir em igualdade de circunstancias com os partidos. Basta pensar na questão do IVA na eleições autárquicas - os movimentos de cidadãos pagam IVA e os partidos não. E este é apenas um pequeno exemplo, poderia falar de tantos outros, como a questão dos símbolo...
    Beijinho e obrigada pela iniciativa do desafio...

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