sexta-feira, 24 de abril de 2015

Abril

Era tempo de brincar, a correria na rua denunciava as crianças que éramos,as duas pedras a fazer de baliza era o nosso maior desejo que por entre elas passasse a pequena bola, tudo á volta era paz.
 De cada vez que o mais habilidoso tentava pegar na bola e rodopiava sobre os demais, tentaríamos sempre o nosso maior trunfo, "Olha a policia" muitas vezes resultava, todos sabiam que os agentes da autoridade não nos permitiam brincar daquela maneira.
 Mas porquê?
 Sempre nos questionamos! Sobre a mais rude proibição daqueles tempos, acho que nenhum adulto devia sofrer tantas represálias como nós crianças, a repulsa era visível nos olhos de cada criança na rua sempre que vinham no seu carocha azul e levavam a nossa liberdade.
Isto é cruel, e mais cruel era a explicação no final do dia ao pai do torturado que ficava sem bola.
Nesse mês de Abril, ganhamos a nossa liberdade, começamos a perceber á nossa maneira que algo tinha mudado, e afinal, a velha táctica do vem a policia, deixara de funcionar.
Havia certos hábitos que radicalmente mudaram, o Sr. Abílio que morava no fundo da rua partiu de urgência, todos diziam que era PIDE, as mudanças começaram  a ser mais visíveis   , diziam entre nós que os patrões da Facar a maior fabrica da minha terra, era agora governada por os trabalhadores, e que fugiram para o Brasil.
Comecei a ver os pelotões da COPCON  que desciam a avenida em exercícios ruidosos, a mesma avenida que meses antes na passagem do nosso Presidente do Conselho servia para que as crianças das escolas com a bandeira nacional acenavam á sua passagem no caminho do aeroporto.
Teria sido aquele olhar de reprovação sempre que a policia nos tirava a bola deu origem a tudo aquilo!
E a foto daquela figura que ocupava em cima do quadro  bem centrada um lugar de destaque, e que deixamos de cantar o hino nacional ?
41 anos passaram sobre a visão de uma criança, entre o que perdemos e ganhamos existem as primaveras vividas, a percepção do realismo!   O sonho pedido e alcançado contrasta com a desilusão
do que era para ser e não foi, do que deveria ter sido e nunca chegou a acontecer, ganhos, perdas e cedências.
O País mudara radicalmente, não haja a mais pequena duvida, mas não mudou a forma de pensar das crianças que hoje olham com a mesma raiva perante os que lhes continuam a levar a sua liberdade  

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