domingo, 5 de março de 2017

A VOZINHA IMPERTINENTE

Conheço algumas pessoas que me dizem conseguir “esvaziar” a cabeça quando se sentem muito cansadas e como isso, dizem elas, as ajuda a recarregar baterias.
Como eu as invejo :) ( inveja boa , nada de mal-entendidos ) penso eu às vezes, mas é só a brincar.
Por (de)formação profissional ou por defeito genético, por mais que tente , eu não encontro o meu botão “off”.
Já encontrei e consigo “manejar” com alguma destreza a “caixa de velocidades do pensamento” , mas mesmo essa, prega-me partidas e em certas alturas, geralmente nas mais impróprias ( de noite por exemplo ), ganha vida própria e invade-me de perguntas que não só me tiram o sono , como me obrigam a revisitar-me por dentro por fora e em contexto para as poder confrontar com alguma consistência .
Vem esta prosápia toda a propósito de , mais uma vez, a minha vozinha do pensamento me ter incomodado o sono esta noite e, mais uma vez de novo, lá pelas seis da manhã, fartinha de o ouvir a fazer-me perguntas, tive que lhe dar atenção.
É que geralmente os meus pensamentos são inconvenientes, não porque sejam impróprios ( :) ) , mas porque vêm sempre carregados de perguntas que nunca são inócuas. Também não são aborrecidas, porque se o fossem era mais fácil mandá-las dar uma curva.
São perguntas com sumo, nem sempre doce, mas sempre carregados de aromas e texturas que me enleiam, me obrigam a reflectir e a ir buscar às profundezas da memorias as ajudas da vida vivida. para as entender e poder responder ou pelo mens tentar encontar resposta ( às vezes vem em forma de novas perguntas e daí o sem fim da coisa :) )
A esta hora ,quem tiver tido a pachorra para ler estas linhas estará a dizer para os seus botões ou para os botões do /a vizinho/a - “coitadinha , pirou de vez”.
.
Lamento desiludir, mas não… não pirei mesmo …ainda ) :).
Atrevo-me mesmo a pensar que estou a viver uma fase de “reorganização interna”, na qual a lucidez e o questionamento selectivo desempenham um papel importante.
Estas incursões nocturnas do pensamento introspsectivo e discursivo são cansativas, admito, mas quase sempre esclarecedoras.
Benefícios do silencio da noite… ficamos mais atentos não só ao que pensamento quer de nós, mas também ao sentir que a nossa incessante procura de respostas nos provoca.
Não é um exercício fácil e requer um pré-requisito essencial – despojamento do ego e verdade na abordagem dos nossos medos e fantasmas. Sem isso, nem vale a pena dar voz ao pensamento porque estaremos a alimentar um monstro e os monstros impedem-nos de “crescer”.
Porque não é um exercício fácil, confrontamos-nos tanto e cada vez mais com gente “amputada no seu Ser essencial, mas do processo de crescimento interno de cada um , cada um se preocupe – o meu já me dá bem que fazer.
Bem, mas adiante, que a conversa já vai longa e se calhar...chata. Voltemos à questão primária que dei origem a tudo isto: o “esvaziamento do cérebro” e os seus benefícios …ou não.
Porque acredito que cada pessoa é ela própria e a sua circunstância, talvez um dia o meu estádio de evolução me permita encontrar o botão de “reset do pensamento” , mas se calhar nesse dia , vou fazer de conta que não o vi , ou então, porque sou educadinha, cumprimento-o, guardo-o na gaveta e deito fora a chave, porque daquilo que me conheço, no dia em que deixar de me questionar sobre a vida e o que pretendo dela, com toda a certeza estarei morta e não terei dado por isso.
Até la, admito a minha incapacidade de “esvaziar o cérebro” e vou tentando gerir esta minha cabeça inconveniente, impertinente e por vezes chata o melhor que conseguir, porque apesar do cansaço e do degaste, continuo a achar que vale a pena.
Não incomodo ninguém…apenas a mim mesma , mas por esse incomodo até que lhe estou grata .
Obrigado cérebro e todas a tuas gavetas, apesar das noites em branco.
Com carinho,
O teu invólucro – Eu...a tua Graça.

6 comentários:

  1. Depois de a ler não me ocorre nada mais que dois pensamentos. O primeiro é uma citação do que disse Florbela Espanca ao pai quando este exclamou: " Minha filha,és tão inteligente e tão infeliz!". Ripostou FE: "Ó pai, meu pobre pai, desde quando a inteligência dá felicidade? Debaixo duma pedra está outra e assim sucessivamente, bem assim como as perguntas e reflexões..."
    O segundo é sobre a "felicidade" que é, nos tempos que correm, um objectivo para todo o sempre e todos bem sabemos que são somente pedaços de vida intercalares aos de sinal contrário, não concorda?
    Desculpe a impertinência pois a Graça estava a "falar de si para consigo" mas olhe, deu-me para isto...

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    1. Deu-lhe para isso e deu-lhe muito bem, porque se eu não quisesse feedback não teria partilhado. Muito grata pelas suas palavras.

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  2. Quando se é um bom médico do corpo é porque também se é um profundo conhecedor da alma, envolvendo as duas componentes do ser humano. O Fernando Rodrigues também podia ter sido padre porque dava um óptimo elemento para perceber as profundezas, os recantos e os encantos das almas. A Florbela, foi casada com um médico e não foi feliz nesse encontro, talvez porque cada um tivesse apenas uma das componentes necessárias para a compreensão total do ser humano. O comentário do Fernando Rodrigues é oportuno e feliz.

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    1. concordo inteiramente - este texto foi escrito as seis da manhã numa recente noite de insónia. O pensamento gritava demasiado alto para conseguir descansar e tive que lhe dar atenção . Obrigada pelas suas palavras.

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    2. Caro Joaquim, fiquei "babado"! Mas o comentado não sou eu e sim a Graça que nos traz escritos muito bons e desencadeadores de... comentário!
      Espero vê-los aos dois no dia 26!
      Ah! Quanto a poder ser padre, Joaquim, vou tentando ser ao menos"sacerdote" pois quanto ao primeiro, não conseguiria ser... casto!

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    3. Se fosse padre na Religião Cristã Ortodoxa e em todas as cristãs protestantes, não necessitava ser casto, pois estes, nalguns casos denominados por pastores não estão impedidos de constituir família. Só os católicos não admitem padres casados. Com o passar do tempo e pela maneira como as pessoas de exprimem, partindo do princípio que são sinceras, se estivermos atentos, vamos percebendo o seu carácter. Logo, o que eu escrevi num momento atrás, corresponde ao meu pensamento, e assim devo divulgá-lo.

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