terça-feira, 6 de junho de 2017

SUSPIROS








Este país tem mais leis do que as necessárias, que são propositadamente entendidas e usadas como arbitrariedades pelos amigos dos amigos que têm os poderes na mão.
É um país cuja riqueza da língua – normalizada ridiculamente nalguns casos – aceita toda e mais alguma interpretação dessas leis, como convêm, não como devia convir ao colectivo.
O labirinto é tão denso, sombroso, que qualquer cidadão incauto porque desconhece a lei a que é obrigado conhecer, e sem imunidade sonante a apoiar-lhe o traseiro, asfixia em poucos minutos nos códigos e regimentos e processos e adendas e o que seja.
São os artigos que revogam outros, não interessa; os decretos que subsituem outros que entretanto se mantêm transitoriamente valendo ambos, e vão ficando ambos, até o sempre; são as alíneas que corrigem os pontos, que acrescentam e  subtraem os pontos e vírgulas….
Tudo é possível, acontece, é justificado com a maior das seriedades em conferências de imprensa, nos almoços e jantares com jornalistas, e passado cá para fora não se sabe nunca por quem, e no final tudo se publica no Diário da República.
A Bem da Nação.
Os de fora adoram-nos porque estão cá de passagem e não têm tempo suficiente para nos conhecer. O país está na moda porque a bacia do mediterrâneo é um local de banhos perigoso, as praias estão mal vigiadas, morre-se afogado; os destinos exóticos deixaram de o ser e há fundamentalistas que afugentam a malta do bikini e dos shorts de marca; o Brasil só se for com guarda costas brasileiros e está caro.
O país não está na moda porque cuida e apresenta com esmero as suas riquezas humanas e materiais, pelo contrário, usa-as, também arbitrariamente como as leis. Está na moda porque sem fazer nada por isso caiu essa sorte nas mãos.
Os Jerónimos, a Torre de Belém, os Clérigos, o Convento de Cristo, são monumentos que gostaríamos de preservar, não é por nada em especial, só porque são a nossa história. Alugam-se por bons dinheiros e quem faz as festas e não manda a seguir a mulher da limpeza. Fecham-nos só para visitas particulares a vedetas do show-bizz,  e nós queremos visitá-los de vez em quando - coisas nostálgicas nossas! - e estamos três horas na bicha a levar com convites obscenos para city-tours de trotinete com um nome ridículo.
Os presidentes da Câmara mandam aparelhar a caleche e prestam visitas a “princesas” poderosas mas ainda assim muito pindéricas, que pernoitam nos hotéis de luxo da cidade e com isto ficam sem tempo para responder a uma pergunta simples de um cidadão que quis saber do andamento das obras do viaduto que entretanto já reabriu, mas não parece nada bem de aspecto, continua pálido.
No tempo de terem partido três autocarros, partiu um e o condutor ainda quis bater nos utentes porque queriam ir para os seus destinos a horas, mas esta cidade é tão linda que não se pode saber de horas: é andar por aí, flanando, o tempo que seja, que nesta cidade o tempo é um espartilho da liberdade. O tanas!
O que interessam os transportes públicos quando os táxis são baratos e optimizam os percursos a bem do cliente? e quando em alternativa se tem essas bicicletas com nome ridículo?
Pronto, desabafou-se, neste caso atirando aleatoriamente, porque se se seguia um plano, escrevia-se um testamento sem garantias de haver fim.
Parafraseando um humorista de radio (onde andam eles?), passem como puderem e não chateiem muito os senhores, eles precisam  trabalhar.


1 comentário:

  1. Uma reflexão muito a propósito sobre o "estado da nação". Na verdade a coisa vai andando, mais por força do destino, que das capacidades exercidas por quem dirige. É preciso analisar profundo e não superficialmente como fazem muitos comentadores mentecaptos de serviço, que são exactamente comentadores pagos porque servem o estado ilusório do país, que serve para adormecer quem não se esforça por aprofundar a situação. Contudo, quando acordarem, afundar-se-ão num mar de lágrimas.

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