A noção do dever
Um dos
principais problemas do nosso país, a todos os níveis, é a excessiva preocupação
com aparências e futilidades, em
prejuízo da eficiência no cumprimento das obrigações que a cada um cabem em
cada caso concreto…
Vemos certos
engenheiros que têm nojo de sujar os sapatos no estaleiro das obras, permitindo
que haja fugas de toda a ordem no cumprimento dos cadernos de encargos,
resultando em construções que se desmoronam às vezes sem estarem acabadas; são
os comandantes dos vários escalões da chamada protecção civil, que pouco ou
nada protege se a coisa dá mesmo para o torto, que se movimentam no teatro de
operações todos engomadinhos, de cintilantes estrelas no uniforme, perante
bombeiros carentes de tudo, sufocados pelos fumos, enfarruscados e chamuscados;
são os coroneis muito cientes dos seus galões, mas que raras vezes farão a
menor ideia de como está a ser protegida a Unidade que comandam, somos todos nós,
um pouco por todo o lado, que só nos lembramos de santa Bárbara quando troveja,
enfim, um sem número de situações a raiar o caricato!
Àquela velha
e relha expressão, “errar é humano”, houve alguém que acrescentou: e atirar as
culpas para cima dos outros é ainda mais humano…
Uma impressionante
noção do dever levada ao sacrifício máximo deu-ma, ainda na casa dos vinte
anos, a leitura de “Os Miseráveis”, em que o inspector da polícia, Javert,
tendo descoberto o fugitivo das galés Jean Valjean, o perseguia sem descanso
pelas ruas de Paris, preparando o momento oportuno para lhe deitar as mãos.
Mas tendo
sido ele próprio apanhado numa barricada de revoltosos, atado de pés e mãos e
pronto para ser fuzilado, foi Jean Valjean que o soltou e lhe salvou a vida,
tendo-se colocado à sua disposição para ser preso.
E Javert, no
terrível dilema de cumprir o dever de defensor da ordem pública e reenviar para
as galés o fugitivo à Justiça, e o sentimento de gratidão pelo homem que
acabava de lhe salvar a vida, não vendo saída que o dignificasse atirou-se ao Sena!
De que tipo
de gente poderíamos esperar hoje, aqui, um gesto desta dimensão?
Amândio G. Martins
Obrigado, amigo Amândio, por este excelente texto. Já ganhei o dia!
ResponderEliminarObrigado eu, senhor Ramalho, pelas suas palavras. Estou tão pouco habituado a receber elogios destes que até fico um pouco embaraçado...
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