Vigilante da
floresta
No tempo em
que o trabalho infantil era considerado escola de vida, eu ajudei ao nascimento
de uma floresta, à qual já aqui deixei alguns versos na forma de soneto. Era
aquele terreno um monte baldio, aonde os habitantes da aldeia levavam o gado,
até ser decidido semear aí pinheiros.
E não houve
família que não pusesse lá alguém, ganhando uns escassos escudos por dia, para
fazer aquela sementeira. Depois de tudo concluído, foi mandado para lá um
vigilante permanente, o Magalhães, para que os animais, habituados àquele
espaço, não fossem estragar o que foi feito.
Naquele tempo
havia muito gado, que não só era fonte de rendimento directo, com leite e
crias, como produzia estrume para fertilizar as terras - que ainda não eram “queimadas”
com químicos - além de que os bovinos faziam todo o tipo de
cargas e lavravam os campos puxando os arados; conforme a extensão a lavrar,
chegavam a ser precisas quatro parelhas engatadas umas nas outras, já que os tractores nem miragem ainda eram…
A menos que
fosse mesmo tão invernoso que não desse uma aberta - e nesse tempo acontecia
chover dias e semanas seguidos - os
gados não comiam nas cortes; eram soltos para as pastagens nos campos e montes
e por lá ficavam quase sempre sem vigilância dos donos, que se ocupavam com
outras tarefas.
Quando a nova
floresta começou a crescer, aquela verdura brilhando à distância atraía os
animais, e era aí que entrava o Magalhães, que raro seria o dia que não fosse
entregar a casa dos donos o gado encontrado a fazer mal. E este homem, que era
de outra aldeia do Concelho, nunca se zangou com ninguém e nunca participou dos
lavradores cujos animais encontrava onde não podiam estar.
Tendo vindo
para cá ainda jóvem e solteiro, ganhou a simpatia e respeito de toda a gente,
casou com uma moça daqui, tiveram muitos filhos, e já no tempo da Democracia
foi eleito presidente da Junta de Freguesia para vários mandatos, que só
interrompeu por vontade própria, pois
ainda não havia o limite que hoje
vigora.
Não havendo
hoje vigilantes florestais, serve este escrito para prestar sentida homenagem a
um homem bom que para cá foi mandado e ficou, deixando grande e respeitada descendência,
que ainda podia estar entre nós se não tivesse sido há tempos brutalmente abalroado
por um sujeito cujo carro descontrolado lhe passou por cima! Até logo, senhor António Magalhães de Araújo…
Amândio G.
Martins
Sem comentários:
Enviar um comentário
Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.