sexta-feira, 28 de julho de 2023

Fidalgos e galgos...

 

Nunca percebi muito bem, pela crueldade que pressupõe na boca de uma mulher, uma frase que minha tia Virgínia usava com frequência, cujo marido fundou na aldeia, ainda eu não era nascido, a única mercearia cá da terra, que ainda hoje é a única que existe – continuada agora por uma irmã minha e o marido - depois da revolução democrática acrescentada de café, matraquilhos e bilhares, onde ela trabalhou enquanto pôde, de manhã à noite; sempre que ouvia dos clientes comentários desprimorosos sobre alguém pouco amigo do trabalho, reforçava o que diziam com o dasabafo “fidalgos e galgos é criá-los e matá-los”.

 

Nunca tendo até agora lido nada de Moita Flores, acabo de ler “A fúria das vinhas”, que me foi há tempos oferecido por minha nora e aguardava a minha disponibilidade; mas para lá da perícia policial de Vespúcio Ortigão que percorre o livro, o que mais me entusiasmou foi a saga de D. Antónia, a célebre “Ferreirinha”, pelo combate contra a terrível filoxera e na protecção dos milhares de trabalhadores que dela dependiam.

 

Defendendo a todo o custo as quintas da família, garantia também com isso o sustento da imensa massa de gente que nelas trabalhava, apesar do esbanjamento valdevinos do primeiro marido e uma descendência que seguia a tendência gastadora do pai; vendo-se viúva e desprezando a fidalguia desocupada e gastadora que tanto entusiasmava a descendência, um segundo casamento, que começou por ser de conveniência, acabou por dar-lhe um braço direito imprescindível para prosseguir, juntamente com colaboradores fiéis e competentes para lutar contra os especuladores que tentavam comprar barato, com fundos suficientes para aguentar os vinhos nos armazéns sem ter que vender a qualquer preço...

 

Amândio G. Martins

 

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