OS CORIFEUS
DO REGIME SABEM DO QUE FALAM?
27/7/1
“A Natureza é avara de homens
superiores
e distribui com abundância homens
medíocres”
Paul Bourget, para o Conde de Haussonville,
citando Bonald.
Ouvimos, há poucos dias, o PM
Passos Coelho fugir-lhe a boca para a verdade ao afirmar que precisamos de um
governo de “união nacional” (o corifeu Marcelo veio, célere, opinar que
preferia “unidade” em vez de “união”).
De imediato outros
corifeus vieram a terreiro polemizar que não gostavam da expressão, pois tal
fazia-lhes lembrar a União Nacional, que designaram por partido único que
servira de esteio ao “Estado Novo”.
Estado Novo que,
segundo o líder do principal partido da oposição, correspondia a um “dos
períodos mais negros da nossa História”.
Em favor da curiosidade intelectual, até que gostaria de
saber quais teriam sido os outros…
Néscio que sou, assaltaram-me dúvidas sobre o que tal frase
quereria dizer e procurei na memória algumas questões que pudessem justificar
tão categórica afirmação do jovem “Tó Zé”, que de seguro tem muito pouco – não
parecendo haver no mercado ansiolíticos que lhe aplaquem as ânsias em que anda,
para se meter em S. Bento.
Coitado dele e de nós…
Escarafunchando no baú da História – que, seguramente, a
rapaziada das “Jotas” não tem tempo sequer de entreabrir – verifiquei que o
“Estado Novo” se institucionalizou em 1933, com a aprovação, em plebiscito, de
uma nova Constituição – consulta popular a que nenhuma outra Constituição
portuguesa foi sujeita, até hoje, desde 1822, inclusive a de 1976 (cujo
Parlamento onde se discutia, chegou a estar cercado por uma multidão ululante).
Antes, porém, (de 1933) tinha havido três “ditaduras”: a
primeira apenas militar, entre 1926 e 28; depois uma ditadura financeira, de
1928 a 32, a que se seguiu uma ditadura política entre aquela data e o ano
seguinte.
E porque terá havido uma ditadura militar?
Bom, talvez o Dr. (creio que o posso tratar assim) Seguro
não acredite mas Lisboa, naquele tempo, parecia a Bagdad actual, com bombas a
rebentar nas ruas e tudo!
É possível que os seus mestres políticos se tenham olvidado
de lhe dizer, mas tal era resultado da “balbúrdia sangrenta”, como antevira
Eça, em que se transformara a I República que, em 16 anos conheceu 45 governos,
dezenas de golpes e contra golpes militares, com civis à mistura; assassinatos
políticos q. b. (incluindo um PR e um PM), participação escusada na frente de
batalha europeia da IGM e a maior conflitualidade político- social (sobretudo
nas grandes cidades), que causou grande disrupção na vida económica e uma
bancarrota crónica, nas finanças, em todo o mundo português.
Por junto o país
estava exangue e desqualificado em termos internacionais.
Este tinha sido o resultado trágico da implantação da
República a qual, segundo os seus próceres iria trazer o paraíso a Portugal.
O Partido Republicano nasceu num ambiente liberal (e de
liberalidade) e podia actuar e exprimir-se à sua vontade. Mas isso não lhe
bastou: sem qualquer razão que o justificasse, tentou subverter a sociedade de
então, atacou miseravelmente a Família Real e, ajudado por uma organização
secreta de cariz violento (a Carbonária), provocou atentados, tentativas de
golpe de estado e acabou manchado com o sangue do crime ignominioso, do
regicídio.
Com estes antecedentes escabrosos não admira que a República
tenha dado no que deu.
Porém, já antes a Monarquia Portuguesa, antiga de 700 anos,
ficou ferida de morte, após a implantação do Liberalismo, em 1820; a expansão
dos ideais da Revolução Francesa, o ataque à Igreja e três guerras civis.
Pior do que tudo isto, todavia, foi que a Nação Portuguesa
ficou refém e foi pasto das sociedades secretas, maçónicas, que quebraram a
unidade da Pátria e minaram os esteios da antiga nacionalidade.
Enfim, os desastres e
as barbaridades foram tais e tantas que se contam pelos dedos os portugueses
que se aventuram pelas páginas do século XIX, que é aquele que a maior parte
dos compêndios de História rapidamente saltam, sem embargo de merecer o mais
demorado estudo e ponderação.
Creio que não
necessito ir mais atrás para enquadrar o que exponho.
Não sei como o Dr. Seguro – e o rebotalho esquerdoíde que
por aí andou, anos a fio, a falar da “longa noite” – qualifica as épocas que
muito pela rama descrevi, mas como chama ao Estado Novo um período negro da
História de Portugal, por certo que este teria que ser pior do que aqueles; e,
relativamente ao que vivemos, então nem se fala…
Fomos, novamente, ao
baú da História e saiu isto.
Em menos de dois anos o Dr. Salazar – de longe o principal
obreiro e ideólogo do Estado Novo – equilibrou o orçamento (cujo “deficit” e
dívida eram, apesar de tudo, menores do que actualmente), o qual nunca mais
“descarrilou” até 1974, ano em que, salvo erro, o escudo era a sexta moeda mais
forte do mundo; pagávamos a pronto; tínhamos o crédito que quiséssemos, sem
haver “ratings” que nos tolhessem, havendo em cofre 50 milhões de contos em
divisas e mais de 800 toneladas de ouro.
Tudo isto apesar da depressão de 1929; a crise da libra, de
1931; a Guerra Civil de Espanha (1936-39); a II GM (1939-45); 14 anos de
operações militares em larga escala, em três teatros de operações diferentes
(1961-74) - fora a questão da Índia (1954-61) e ainda devolvemos, em “cash”, em
1962, o pouco que usufruímos com o Plano Marshall…
Passemos à Economia.
Em 1926 a Economia, como tudo o resto, estava arrasada em
todos os sectores. As próprias infraestruturas existentes – estradas, portos,
caminhos - de - ferro, comunicações, transportes, etc., que tinham tido algum
desenvolvimento no fim da Monarquia Constitucional, estavam num estado
lastimoso. Algumas delas e outros serviços, tanto na Metrópole como no
Ultramar, estavam em mãos estrangeiras, sobretudo inglesas.
Aliás, o País estava,
na altura, perfeitamente colonizado economicamente pela Inglaterra e,
culturalmente, pela França. Também foi o “Estado Novo” que operou a
“descolonização”…
Com as Finanças em ordem, deu-se início à recuperação das
infraestruturas atrás apontadas – sem as quais a economia não se desenvolve – e
cuidou-se do sector primário, pois este é a base de tudo o resto e é necessário
dar de comer à população todos os dias…
Parece que os políticos,
antepassados recentes do Sr. Seguro, se esqueceram destes pormenores!
Quando as infraestruturas estavam prontas, nomeadamente a
energia, começou a implantar-se a indústria. E, pela 1ª vez desde Afonso
Henriques, gizou-se um plano (chamado de fomento), a partir de 1951,
devidamente estruturado, estendido no tempo e sustentado, que permitiu
desenvolver o sector secundário e, acompanhando-o, o terciário.
Tal veio a desenvolver-se, sempre positivamente, não sendo
sequer prejudicado pelas agressões ultramarinas a que nos sujeitaram.
Em 1973 crescia-se a 7% ao ano e em Angola e Moçambique era
superior.
Não se fez tudo o que era preciso fazer, mas fez-se tudo com
calma, com segurança, institucionalmente e com critério.
Não há notícias de escândalos com negociatas, “comissões”
individuais ou para o partido, derrapagens, engenharias financeiras tipo “PPPs”
ou outras.
A subversão comunista estava
posta em sentido, as multinacionais não faziam o que queriam e o capital
estrangeiro não mandava no Governo.
A corrupção, não sendo
inexistente, era combatida e estava controlada.
Tudo isto se conseguiu porque
havia ordem nas ruas, apesar das “quarteladas” se terem feito sentir até aos
anos 40 – após o país ter estado, na prática, em guerra civil por mais de um
século, não era fácil acabar com a agitação de um dia para o outro – e porque o
governo governava sem ter que passar a vida em lutas político-partidárias
estéreis e fratricidas.
Em termos diplomáticos o País
retomou o seu normal entrosamento na vida internacional, não se limitando ao
exercício das relações internacionais, como hoje maioritariamente acontece.
Tinha interesses a defender e defendia-os.
Atingiu até, picos de excelência,
nomeadamente durante a Guerra Civil de Espanha, na II GM, na entrada para a
OTAN, para a EFTA e quanto ao acordo com a CEE; e na defesa das parcelas
ultramarinas, que grande parte da comunidade internacional queria subtrair à
soberania portuguesa.
Neste âmbito só há a lamentar a
perda do Estado Português da Índia, e só ao fim de 14 anos de patifarias
culminando com um deplorável uso da agressão militar. Mesmo aqui não se pode
acusar os órgãos de soberania de qualquer comportamento antipatriótico.
Não consta ainda, que qualquer entidade estrangeira tenha
interferido na condução da política nacional nem que o Governo Português alguma
vez solicitasse ajuda seja a quem fosse.
Por acaso o Dr. Seguro imagina o
FMI ou a “Troika” a passear-se no Terreiro do Paço no tempo da “outra senhora”?
Tentando perceber o imaginário do
líder do PS, será que ele pensa que os tribunais há 50 anos levavam dez, para
julgar um assunto simples, como agora acontece?
Que a Segurança Social é uma
invenção pós abrilina?
Que os alunos e os pais dos
mesmos batiam nos professores, como acontece um pouco por todo o país e não
apenas na Musgueira?
Ou que muitos professores deviam
era estar no lugar dos alunos e que muitos destes chegam ao 12º ano a saber
menos do que eu sabia quando fiz a 4ª classe?
Pensará que as crianças ficavam
fechadas em casa, ociosas a comer guloseimas e hidratos de carbono, frente a um
visor qualquer, em vez de virem brincar para a rua com os amigos?
O Dr. Seguro pensará que se
andasse a passear em meados dos anos 60, no auge da chamada revolução sexual,
do movimento hippie, e da porcaria que representou o Maio de 68, em França,
encontrava alguém a injectar-se nas ruas da Mouraria?
Pensará que os cuidados de saúde
só passaram a existir depois de terem inventado o Serviço Nacional de saúde?
(uma coisa, aliás, bem pensada, mas porque só agora começou a ser controlado e
aferido, está em vias de colapsar).
Diga-me, Dr. Seguro, o que lhe
vai na cabecinha para considerar, em qualquer área da sociedade, tais tempos como
ominosos?
Ah, creio finalmente ter
percebido um sussurro: o regime não era democrático!...
(Continua)
João J. Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
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