terça-feira, 4 de julho de 2017

Tomem arsénico

O médico Joaquim Guilherme Gomes Coelho nasceu e morreu no Porto, com a curta idade de 32 anos; e é impressionante que em tão pouco tempo de vida tenha podido, além de formar-se em medicina escrever, com o pseudónimo de Júlio Dinis, vários romances que a todos achei deliciosos.
Tirando “Uma Família Inglesa”, os restantes são de temática rural, para os quais se terá inspirado naqueles períodos de vilegiatura a que a tuberculose o obrigava em ambiente campestre, onde procurava a cura para aquela doença que acabou por lhe tirar a vida.
De “As Pupilas do Senhor Reitor” ficou-me, desde muito novo, uma cena impagável interpretada pelo grande actor António Silva no papel do merceeiro “João da esquina”, quando o jóvem médico filho do lavrador “José das Dornas” teve a imprudência de lhe descrever a composição de determinado medicamento que lhe prescrevia, cujo elemento principal era arsénico.
“Arsénico! O senhor quer que eu tome arsénico?” – exclamava “João da esquina”. Para acalmar o homem, o jóvem “Daniel das Dornas” dizia-lhe que o arsénico era muito usado na Áustria na ração dos cavalos, para lhes tornar o pêlo mais luzidio; e em certa região da Alemanha as raparigas também o tomavam para conservar o aspecto jóvem.
“Pois que se regalem”- desabafava “João da esquina”, furibundo. Mas Teresa, mulher de João, muito empenhada em impingir ao jóvem médico a filha Chica, para ser agradável ao rapaz insistia com o marido: “toma arsénico, homem, toma arsénico”.
Ocorreu-me esta expressão de “Teresa da esquina” ao ver um dia destes o líder da Oposição, desesperado, perante uma plateia atenta e entusiasmada como um mocho, servir-se das desgraças que têm acontecido para exigir a demissão de meio mundo. “Toma arsénico, homem, toma arsénico”…


Amândio G. Martins

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