quarta-feira, 15 de setembro de 2021

 

A FILA DA FEIRA DO LIVRO


O Parque Eduardo VII é um dos locais mais aprazíveis de Lisboa. Todo aquele verde, e do cimo, deslumbra-nos o Marquês, a Avenida da Liberdade, o Castelo, a Baixa Pombalina, o Cristo Rei de braços abertos a oferecer-nos um abraço, e o Tejo, deitado lá em baixo, espreguiçando-se até à Outra Banda.

Portanto, só por isto, já vale um passeio àquele pulmão da capital.

Mas, até domingo passado, por uma razão imperdível, ainda mais se justificava. Claro que nos referimos a essa imensa exposição de saberes, de cultura, que é a Feira do Livro.

E é sempre uma oportunidade para se poder adquirir livros a preços mais reduzidos, folheá-los e “descobrir” imensos.

Desta vez, Uma dessas “descobertas”, foi um livro extraordinário, sobre essa personagem sinistra que tão negativamente marcou a vida deste país durante quase meio século; Salazar. Mas, “O Cavador que Lia Livros no Tempo de Salazar”, Edições Colibri, é também uma obra fundamental para se conhecer em pormenor o que foi a dolorosa saga dos trabalhadores agrícolas do Alentejo durante a ditadura. Desde o nascimento, às mãos de curiosas em que tantas vezes mães e filhos sucumbiam, uma taxa de mortalidade infantil e analfabetismo elevadíssimas. E depois, vidas de trabalho árduo de sol a sol, até cair, sem a mínima assistência social, terem de estender a mão à caridade. Mas, clandestinamente, porque até isso, o ditador proibia. O resultado, para tantos, face ao desespero, o suicídio.

Mas também refere, a luta, por melhores condições de trabalho e de vida. A ganância dos latifundiários e a repressão da PIDE e da GNR, ao seu serviço e do regime.

Ainda não tive o prazer de conhecer pessoalmente o seu autor, mas não costumo perder os seus artigos de opinião aqui em “O Setubalense”. Tantos deles, autênticas lições de história.

Parabéns, professor Francisco Cantanhede!

Dia 29/8, domingo, muita afluência, diversos autores autografando as respetivas obras, tantos deles com pouco “trabalho”. Uma boa parte dos visitantes eram mirones… Mas estava animada a Feira e nada de especial. Até que, deparamo-nos com uma enorme fila. Sobretudo jovens raparigas mas também rapazes e mais adultos. de livro na mão, por um autógrafo.

Não, não se tratava do nosso companheiro de escritas Francisco Cantanhede, nem de, por exemplo, Lobo Antunes, José Luís Peixoto, Valter Hugo Mãe, João Tordo, ou qualquer dos grandes escritores contemporâneos vivos. Nem sequer, que tivéssemos “passado pelas brasas” e sonhado tratar-se de Saramago, Aquilino, José Cardoso Pires ou qualquer outro dos nossos clássicos, monstros sagrados da literatura. Nada disso!

Por quem aquela gente esperava pelo almejado autógrafo, era Raul Minh`Alma.

Trata-se de um jovem que escreve historiazinhas cor de rosa, “literatura” leve, para não dizer de cordel, mas que vende que se farta. Por exemplo, com títulos como “Larga Quem Não te Agarra” ou, “Foi sem Querer Que te Quis”, em 2019, foi o autor que mais vendeu neste país.

Para reflexão, aqui fica.

Francisco Ramalho


Publicado ontem no jornal "O Setubalense"






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