Pedrógão Grande: a “mão criminosa” e a “mão” preventiva
Pedrógão Grande, 17/6/2017.
Perante uma tragédia desta dimensão
humana e social (a das vítimas e das suas famílias), talvez o mais correcto
seria estar (respeitosamente) calado, como silêncio significativo de pesar e
solidariedade para com os familiares das vítimas. Mas também para com todos(as)
os (as) que, de algum modo, combateram o fogo ou ali prestaram socorro a quem
dele necessitou.
Ainda assim, talvez valha a pena
reflectir, de entre as várias abordagens que a situação mereceu e continua a
merecer, um aspecto a que vários jornais deram muito relevo: “Polícia
Judiciária (PJ) afasta a possibilidade de mão criminosa”.
Já (quase) nos habituámos a darmo-nos
por satisfeitos com a explicação (só) criminológica, judicial, em muitos
domínios e um deles é o dos incêndios florestais.
E também neste caso, há o risco de
restar a ideia de que o mais importante, o mais “explicativo”, é a análise criminológica.
Não é.
Sim, parece que está explicada a origem,
a “ignição”, a causa natural (uma trovoada, .mais especificamente, uma “faísca”
numa árvore) do(s) incêndio(s).
Sim, estão explicadas as condições
contextuais (temperatura elevada, pouca humidade, demasiado vento) de
alimentação do(s) incêndio(s).
Porém, não está explicado por que é que estava
ali, naquele local, tanto (e que) combustível (floresta) em condições de arder
(que diversificação, que compartimentação, que afastamento da estrada, que monitorização...?).
Tal como não está explicado por que é
que ali, naquela estrada, naquele local, naquela hora, com um violento incêndio
a arder na zona, puderam ali estar (circular) tantas pessoas, as dezenas de
vítimas.
Por isso, mais, muito mais, importante
que saber se ali houve “mão criminosa” é saber, reflectir (prospectiva e,
sobretudo proactivamente), se (também) ali, de algum modo, não houve “mão”.
Saber se (também) ali não houve, em
devido tempo e medida, de algum modo, falta de “mão” preventiva.
E, já agora, por que é que agora somos
mais induzidos a fazer tal reflexão?
Porque alguém, qualificado (a PJ), vem
dizer que “não houve mão criminosa”.
Se, porventura, a PJ (ou qualquer outra
entidade) viesse dizer (ou tão só admitir, ainda que pelo silêncio, não negar
categoricamente como já negou) que “houve mão criminosa”, a reflexão acabaria
aqui: houve “mão criminosa”, está tudo (facilmente) “explicado”. E pronto!
Isto para dizer que, neste como noutros
domínios (mas sobretudo neste), a “mão criminosa” (e não só…) tem sido, muitas
vezes, o “manto diáfano” que tem escamoteado outras responsabilidades, mormente
as relacionadas com a (não) assumpção das medidas adequada, suficiente e
atempadamente preventivas.
João Fraga de Oliveira
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