sábado, 7 de agosto de 2021

 

EVIDÊNCIAS


Devia ter uns quarenta e tal, cinquenta anos. Mas as agruras da vida e as injustiças desta sociedade, davam-lhe uma aparência bem mais velha. De máscara, cabelos compridos, empastados, saia e blusa desbotadas, chinelas de enfiar no dedo, saco de plástico na mão, entra na carruagem do Metro, tira a máscara, dirige-se aos passageiros em voz alta a descrever os revezes da vida que a levaram a apelar à sua compaixão e solidariedade, volta a colocar a máscara , de mão estendida e olhar suplicante, inicia o peditório.

Já a meio da carruagem, e nada! Até que uma jovem procura na mala, e estende-lhe um iogurte. Chega ao fim daquele lado da carruagem e foi sentar-se num dos poucos lugares vagos. Tira de novo a máscara, e devora sofregamente o iogurte.

O jovem que se encontrava sentado à sua frente, numa evidente atitude de enfado, quiçá até de repulsa, levanta-se num ápice, e foi postar-se de pé, no espaço para tal, à entrada.

Em contrapartida, perante tão evidente manifestação de “apetite”, outro passageiro levanta-se, fulmina o jovem com um olhar, e diz em voz alta, talvez para sensibilização geral: “ a senhora estava mesmo com fome! Tome lá! E estende-lhe uma nota de cinco euros.

Outro passageiro seguiu-se, e outro e outro, até o jovem que se tinha levantado incomodado,criando comoção geral, chega junto da pobre mulher, pede desculpa, e dá-lhe também umas quantas moedas.

Francisco Ramalho


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