quinta-feira, 23 de novembro de 2023

O guloso e o desejoso

 

Sou dos que valorizam a capacidade de cada um rir de si próprio, de não ser ele a encarecer os seus feitos, quando o que conseguiu, por merecedor de elogios que possa ser, não deixa de ser apenas o cumprimento daquilo a que estava obrigado por lhe terem dado as condições e acreditado nele para essa tarefa; daí que me pareça ridículo alguém que se lamenta de nunca ter recebido uma condecoração pública, ou tendo-a recebido, a ache pequena para a sua grandeza, querendo fazer crer que outros, por muito menos, ostentam o peito cheio de comendas e realçando a “falta” de quem está em dívida consigo.

 

E foi o que vi há pouco fazer um canoista de topo, com o que desceu uns bons degraus no meu conceito, não sendo impedimento para isso o facto de até ser meu conterrâneo, tanto mais que se trata de um rapaz com razoável instrução, tendo por isso obrigação de saber distinguir o que é ou não aceitável, e tendo sempre presente que, sendo uma “figura pública”, tem mais obrigação de controlar o que lhe sai pela boca, tanto mais importante quanto se sinta um vencedor; é verdade que matizou a exigência, acrescentando que o treinador também merecia ser condecorado, o que me fez recordar o que dizia a minha avó Custódia Maria, sempre que algum dos netos lhe pedia alguma coisa para um irmão ou primo, sabendo que, se satisfizesse o pedido, se via constrangida a dar a todos: “Pede o guloso para o desejoso”...

 

Amândio G. Martins

 

 

 

 

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