Foi dos piores anos
dos últimos.
Declara-se a absoluta
ineficácia do ano corrente para lidar com a dor. Toda a dor.
É uma declaração
tardia, mas a intenção é das melhores, acabar com esta pouca vergonha.
Colectou-se tanta
culpa no cartório que se levaria todo um novo ano a ler o acordão. Opta-se
assim pela síntese, enunciando e de raspão, as mais criminosas:
Foi um ano indigente
quanto ao ódio, o racismo, as fobias, a omissão do sofrimento dos outros.
Nunca se lavou das
mortes arbitrárias, como se fossem quotas de caça atribuídas as potências;
fingiu que não ouviu o choro de crianças órfãs, esfomeadas, espoliadas da
dignidade de ser. Imagine-se a sujidade que tresanda!
Este ano poluiu o
mundo. Desconsiderou a natureza. Sodomizou-a. Apropriou-se de recursos
indevidos e escassos e prepara-se para vender a água a preços exorbitantes e não
para todos.
Apesar dos incentivos
e cada vez haverem mais mulheres e homens bonitos e bem-apessoados, não se amou
o suficiente para equilibrar os níveis e baixar os índices de raiva e espuma no
canto da boca.
A soberba ganhou
muitas medalhas; a mesquinhez esteve na primeira fila de todas as galas; a
ignomínia foi a soprano com mais actuações e encores ao vivo.
O poder cego é o
cancro com maior incidência e prevalência no mundo ocidental. No outro também,
mas chama-se democracia musculada: pestaneja-se e vai-se a banhos para um resort de luxo. Não é assim, alguns
amigos do peito da CPLP?
A manipulação da
palavra - pelos meios - aumentou o número de casos de masoquistas empedernidos,
com enfarte causado pela opressão, que recorreram ao sistema nacional de saúde.
Por isso colapsou,
com utentes a mais.
Estamos todos fartos
de olhar para este ano, nunca mais acaba. Vamos acabar nós com ele.
Iniciou-se um ritual
vudu de espetar agulhas, para exorcizar pelo definhamento rápido este ano horribilis.
Enquanto se espetam
as agulhas e se dança catatonicamente à volta do ano diabólico, devemos
asneirar, muito, repetindo alto e em coro esconjuros potentes:
A política fede e é
incontinente.
A política é uma
espelunca sifilítica.
Os interesses
geoestratégicos são um jogo de poker
viciado.
A industria do
petróleo e outras poluentes são dirigidas por seres de outros planetas,
alienígenas que se misturam entre nós para destruir a humanidade (sim
acreditamos em teorias da conspiração bem apimentadas e com bons enredos).
Apesar dos chocolates
serem bons, as cápsulas de café não são recicláveis e há empresas com planos
maquiavélicos para se apoderarem de toda a água no mundo.
Todos os leaks e os papers, têm halitose.
Os deuses foram de
férias prolongadas depois de nos inventarem.
Os deuses preferem os
deuses aos homens.
Os deuses são
egoístas e pouco solidários. Os homens aprenderam com eles e também o são,
apesar de haver meia-dúzia que pratica acções caritativas.
Quando dermos cabo
deste ano, é bom precavermo-nos já para o próximo. Atentos, ao mínimo sinal de
esperteza saloia, logo com uma cachaporra em cima, para amainar ideias que ande
a germinar.
Deseja-se que 2017
nos surpreenda e se assim o fizer pode contar connosco para a folia, darmos uma
mão ou ambas para concluir os telhados de tão desabrigado que anda o mundo.
Se não nos
surpreender nunca mais devemos comer passas: é um logro bem montado dos
industriais das passas!
Temperadas pelo espírito estas análises e recomendações, o que prova que o progenitor, lá muito no fundo, ainda cultiva a esperança. Perante todo o desencanto que está instalado, mas que os néscios não o sentem, que fazer? O homem está ao serviço da economia, ou seja, o artífice está ao serviço da ferramenta, pois o número, a estatística é que domina, sem ser tida em conta as pessoas. A máquina tornou-se tão poderosa que o maquinista tornou-se dela dependente e é ela que comanda as operações. Esta civilização tornou-se artificial e é impossível dar-lhe um rumo humanista.
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