segunda-feira, 24 de outubro de 2022

"Memórias de Adriano", o democrata-cristão


A morte de Adriano Moreira veio relembrar-me alguns conceitos, infelizmente adulterados pelos tempos. Antes de mais, por óbvias razões, a ideologia democrata-cristã. Mas também a social-democracia, o socialismo e o comunismo. De ideários que eram, tornaram-se rótulos desprovidos de conteúdo. 

Enquanto a Europa manteve, na sua matriz político-partidária, alguma justaposição com aquele universo, pôde invocar o seu papel de guia no panorama mundial. Convertida à “tirania” dos poderes económico-financeiros, perdeu-o.    

Algures pelos finais da década de 70, começaram a emergir novas correntes de pensamento, hoje dominantes, que viriam a alterar o statu quo até aí vigente. Para além da drástica alteração no “equilíbrio” das relações Trabalho-Capital desde o pós-guerra, cedo se verificou o progressivo despojamento conceptual das quatro tendências assinaladas. Creio mesmo que, na Europa (talvez em Portugal o fenómeno se torne particularmente mais visível), nenhum dos partidos que ostenta no seu título algum daqueles distintivos, faz jus, no seu actual ideário, às convicções fundacionais. Na actualidade, podem-se auto-denominar democratas-cristãos, sociais-democratas, socialistas ou comunistas, mas todos perderam a ligação aos princípios-base fundacionais. Pergunte-se aos políticos e aos eleitores mais jovens quais os significados daquelas ideologias, e não tenho dúvidas de que muitos os desconhecerão, ou, no máximo, darão respostas disparatadas. 

Tenho particular respeito pela figura de Adriano Moreira. Como por Sá Carneiro, Mário Soares e Álvaro Cunhal, sem esquecer Freitas do Amaral. Não se trata aqui de saudosismo, ou de desvalorizar a qualidade política da população jovem, mas de constatar que o panorama ideológico da actualidade possui frágil sustentação política. Entretanto, assistimos à permanente adesão a novos padrões partidários, minados pelo sectarismo e pelos interesses, individuais ou dos “grupos” a que se julga pertencer. Possa a memória de Adriano Moreira contribuir para atalhar a tanta incoerência.


Nota: este post foi inicialmente publicado sob o título "Adriano Moreira, cristão-democrata"; peço compreensão pela alteração agora registada.

2 comentários:

  1. Estou há 20 minutos a tentar descortinar um pormenor em que discorde. Desisto. Parabéns José Rodrigues.

    ResponderEliminar
  2. Caro Valdigem,
    Obrigado pelas suas palavras. Mas, quem sabe, com um tempo de compensação, como no futebol... mesmo no último minuto!

    ResponderEliminar

Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.