terça-feira, 25 de outubro de 2022

 UM PISCO NO MEU QUINTAL


Durante dois ou três dias da semana passada, andou um pisco no meu quintal. Mais precisamente, um pisco-de-asa-branca, também conhecido por taralhão. Antigamente, vinham aos milhares. Assim como piscos-de-papo-amarelo e outras espécies migratórias. De ano para ano, cada vez têm vindo menos. Por isso, senti um misto de nostalgia e apreensão ao ver a avezinha, tão comum nesta época do ano, nos meus tempos de infância, no Zambujal de Sesimbra.

Era o tempo em que as estações do ano estavam bem demarcadas. No princípio deste mês, começava a escola, o tempo a arrefecer e as primeiras chuvas. Era sempre assim. Agora, como sabemos, não é. Chove repentina e torrencialmente, ou está semanas ou meses sem cair uma pinga de água. Portanto, são as preocupantes alterações climáticas. E daí, a passarada de arribação já quase não vir, e outros fenómenos cíclicos da Natureza que se vão quebrando.

São os efeitos da poluição. E o que é que se faz para evitá-la? Zero! Melhor, agrava-se.

E somos “forçados” a falar da guerra. Desta maldita guerra que já tanto mal provocou e que poderá provocar bem mais.

São gasodutos, oleodutos, pontes que se rebentam, e até centrais nucleares em perigo de o serem, e depois, como diz o Fausto, a guerra é a guerra, retaliações e mais retaliações. É uma perigosíssima espiral alimentada por protagonistas exteriores com mais armas e cada vez mais sofisticadas. Até onde poderá chegar? Nunca se falou e temeu tanto esse pesadelo que é o nuclear. Até agora, como se sabe, apenas usado duas vezes por um dos dois principais protagonistas.

Portanto, a guerra, para além da morte e destruição, provoca também mais poluição e agrava a alteração do clima com as consequências já referidas e outras.

Não queria voltar a maçar os caros leitores com as suas origens, mas, perante a avalanche tendenciosa da comunicação social dominante que aponta o dedo apenas num sentido, voltar a lembrar que os acordos de Minsk sobre a desde há muito massacrada região do Dombasse que não foram cumpridos e, como diz o Papa Francisco, a NATO a ladrar às portas da Rússia e, presentemente, em vez de conversações, os interesses do complexo militar industrial dos EUA, falam mais alto. E a União Europeia e o Reino Unido, deixam-se arrastar, alimentando o conflito e prejudicando os povos.

É fundamental um compromisso. Não são questões ideológicas que estão em causa. Dos dois lados, é o capitalismo que impera. Nos EUA, na Ucrânia, na Rússia, são os oligarcas que ditam as leis. E os primeiros, há muito que almejam a hegemonia global. Aí estão as guerras da Jugoslávia, do Afeganistão, do Iraque, da Síria, da Líbia, e esta, a prová-lo.

Claro que lamentamos todas as vítimas. Mas quando os vemos também a fazê-lo pelo povo ucraniano, quando o seus aliados, Israel e Arábia Saudita, massacram o povo palestiniano e o iemenita, respetivamente, e quando no Iraque, só devido às sanções impostas, calcula-se que tenham morrido 500 mil crianças, não será uma imensa hipocrisia?

Francisco Ramalho


Publicado hoje no jornal "O Setubalense"






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