De corda ao pescoço
Cada vez que surgem notícias, vindas de Bruxelas, sobre a economia
e as finanças portuguesas, em especial sobre as metas orçamentais, é sempre sob
a forma de correctivo, como se um professor se dirigisse a um aluno relapso,
que merece ser castigado, mas que a sua benevolência faz com que se adie, para
mais uns meses, a decisão sobre o castigo pendente a aplicar. O país sofre,
perde consistência, e os portugueses vivem numa permanente situação de
menoridade.
É vergonhoso e doloroso navegar neste clima hostil e, no
parecer fundado do protector europeu, em estado pecaminoso. Mas, para além do
desprezo com que os mais pobres são mimoseados, a insensibilidade dos mais
altos dirigentes, especialmente europeus, é uma evidência que revolta qualquer
pessoa sensível.
Nenhum português, de corpo inteiro, pode ser considerado
cidadão, com cartão ou não, estando sempre pressionado por um areópago, que
despreza os seus legítimos direitos de ser considerado pessoa e não, apenas, número
estatístico.
Aos senhores que se alimentam directamente da União Europeia,
que suga os países que a compõem, pouco lhes interessa os problemas dos
cidadãos comuns que têm necessidades, desde a falta de emprego até à perda da
habitação, pois eles, lá do alto da montanha, não olham para o sopé.
O governo português apresentou aos tutores, de forma
envergonhada, as difíceis contas do cumprimento do orçamento do ano transacto.
Suas excelências, do alto do seu poder, como não têm tempo para dar já o seu
aval, prometem perceber as dificuldades que surgiram na governação, e sugerem
mais sacrifícios, para colmatar previsíveis falhas, deixando no ar eventuais
castigos ou, no final, um clemente perdão.
Isto tem de nos envergonhar, porque, se somos uma família
europeia, qualquer problema de um país é uma parte que afecta o todo.
O que dói mais, é a maneira, pouco respeitosa, como os
dirigentes governamentais aferem as posições dos diferentes países da União
Europeia, pois os cidadãos dos mais pobres são como enteados, e os dos mais ricos
e industrializados são filhos legítimos da União Europeia. Aos países da cauda
dão-se ajudas financeiras, parciais, para estradas, pontes e linhas de
transporte, mas não se consente que se criem estruturas industriais que entrem
nas linhas dos produtos exportáveis e transacionáveis, concorrentes com os
países poderosos que estão implantados no terreno. Entretanto, a maioria dos
nossos representantes baixa a cerviz, e entra na festa, como se tivesse perdido
a sua identidade nacional e alcançado o estrelato europeu.
Joaquim Carreira
Tapadinhas, Montijo
Publicado hoje (8.06.2016), na íntegra, no Diário de Notícias, na secção Cartas dos Leitores, pág. 6.
ResponderEliminarLi e gostei muito da sua interpretação a tudo o que se passa em Bruxelas, com Portugal à perna.
ResponderEliminarComentar o quê?. Está tudo dito!!!...
ResponderEliminarMuito obrigado a ambos, José e Fernanda, pela simpatia e pelo acordo com as minhas palavras.
EliminarPublicado hoje (10.06.2016), com cortes, no jornal Expresso, na secção Cartas, página 38.
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