O último Tamerlão
*Cristiane Lisita
A dinastia Timúrida, de origem turco-mongol, e muçulmana sunita, abrangia
terras na Ásia Central, no Irã, nos atuais Afeganistão e Paquistão, bem como parte
do Cáucaso e da Mesopotâmia. Foi Timur, conhecido por Tamerlão, o Coxo, o último
conquistador nômade da Ásia Central que, no século XIV, reuniu, à sua volta, um
vasto exército formado de diversas tribos, valendo-se de sua índole militar, de
sua esperteza política e de força bruta para derrubar impérios. Dizia ele ser
descendente de uma das quatro tribos advindas de Genghis Khan, para justificar a
tirania.
Segundo o historiador Arabshah, de Damasco, a fidelidade
monopolizada por Tamerlão certamente seria resultado de seu sucesso como ladrão
de ovelhas que possuía muitos seguidores também ladrões, posteriormente, demudados
em guerreiros competentes e disciplinados. Para outros, ele se revelava às
vezes culto, mas quase sempre cruel. A sua personalidade complexa se
descortinou na luta ferrenha com os vizinhos, conservando ocupados os seus exércitos,
a fim de evitar clamores. Tamerlão assinalou seu nome na história por tamanha atrocidade
física e moral com os povos vencidos. Era desse modo que impunha o que ele titulava
de ‘respeito’, mesmo além das estepes da Ásia Central.
O Canato Chagatai observou em Tamerlão um estrategista
capaz de tudo pelo poder. Um homem que sequer honrava sua palavra diante dos sucumbidos,
a exemplo de uma equipe cristã de Sivas, na Armênia, quando questionou os
termos para uma rendição, Tamerlão jurou que não derramaria uma gota de sangue:
enterrou-os vivos. Dissimulado, seu hobby,
ainda, era pedir aos soldados as cabeças dos combatidos. No entanto, o algoz
não gostava de ser chamado de bárbaro. Apreciava a arte. Poupava, tão somente, os
que podiam servir aos seus interesses.
A morte do líder implacável, em 1405, a caminho da
China, já septuagenário, acarretou a fragilidade de sua dinastia com as sucessivas
rivalidades tribais que ocasionaram as divisões dos mongóis, somada ao
fortalecimento dos reinos conquistados, culminando com sua dissipação pouco
tempo depois. O alcance das usurpações de Tamerlão ensejou a delonga da queda
de Constantinopla, e a cultura mongol na Índia, com o derradeiro imperador
deposto no final do século XIX.
No mausoléu de Tamerlão, aberto em 1941, estava
escrito: “Quando me erguer da tumba, o mundo tremerá”. O antropólogo
russo encontrou no interior a inscrição: "quem abrir isso será derrotado
por um inimigo mais medonho que eu". Dissidências à parte, no dia
seguinte, Hitler invadiu a União Soviética, e deixou, depois, milhões de
mortos. Assim, que o último Tamerlão descanse na luz branca de seu jazigo,
junto à relva verde, na simetria suntuosa dos azulejos azuis. Que o último
Tamerlão quebre o prenúncio das palavras, em árabe antigo, decifradas, impedindo,
quiçá, a sordidez de outro Tamerlão.
*Cristiane Lisita (jornalista, escritora, advogada. Pós-Phd pela Universidade de Coimbra)
Quiçá as várias faces de Tamerlao que despontam na atualidade sucumbam antes de trazer mais miséria e sofrimento ao povo. E que esse legado macabro nao seja jamais desenterrado. Que possamos caminhar com segurança e esperança de dias melhores. PARABENS MAIS UMA VEZ A AUTORA.
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