Artigo publicado no jornal
Diário da Manhã de Goiânia, Brasil no dia 25/04/2018, caderno Opinião
Pública, pag. 5. Um dos poucos jornais no mundo que aceita artigos dos
leitores. Site do jornal: dm.com.br
|
Agressão à Síria: Uma velha história que se repete
A Síria que, desde priscas eras,
sempre foi palco de domínios de todos os impérios (egípcio, grego, romano) com
escaramuças, invasões e subjugações de toda espécie, nunca pode experimentar a
autodeterminação de nação livre, a não ser durante o apogeu das conquistas
árabes, quando a milenar Damasco teve a fugaz opulência de ser verdadeira
capital de todo o oriente médio.
Sobreveio o tirânico império otomano
da Turquia, cujos radicais dirigentes muçulmanos promoviam tenaz perseguição
contra os cristãos, a ponto de familiares destes se verem obrigados a partir
para o exílio. Meu avô materno, (José Jorge Badra) em plena adolescência, teve
que dizer adeus aos pais e a sua querida cidade praiana de Latakia, a histórica
Laodiceia, para buscar a liberdade no Brasil, casando-se na cidade goiana de Goiandira,
foi chefe de numerosa família e prestou grandes serviços à sociedade local.
Dizimado o império otomano, no final
da primeira grande guerra, veio a subjugação das potências ocidentais
vitoriosas. O Reino Unido retalhou o oriente médio como quis. Coube à França o
chamado mandato sobre a Síria, que logo se viu privada de toda a região territorial
do Líbano.
A dominação francesa foi cruel e
sanguinária para sufocar os anseios de independência. Damasco foi alvo de
intenso bombardeio, com morte de milhares de civis, inclusive crianças.
Conquistada, a duras penas, sua
independência, a nação Síria, depois de golpes e contragolpes militares e de
uma passageira união com o Egito (Republica Árabe Unida) veio a guerra com
Israel (braço armado atômico dos Estados Unidos na região) e teve as colinas de
Golan tomadas pelos judeus, que nunca as desocuparam.
Na atualidade, um regime oligárquico
da família Assad governa o país, cujo autoritarismo nada difere de outros
dominantes na região, sobretudo na Arábia Saudita com sua eterna dinastia de
reis, e na própria Turquia com seu presidencialismo ditatorial, mas somente
Bachar é chamado de ditador pela mídia facciosa, sempre a serviço dos
interesses imperialistas das potencias ocidentais.
Uma cruenta guerra civil, há bastante
tempo, assola a Síria, onde os rebeldes da oposição armados pelas referidas
potências tentam derrubar o governo apoiado pelo Irã e Rússia. Tudo começou com
a eclosão da fantasiosa primavera Árabe sob pretexto de uma luta pela
implantação da democracia em alguns países.
A Síria vivia um período de estabilidade,
através de um regime laico tolerante a todos os credos religiosos e gozava de
todo o respeito das nações vizinhas. Descobriu-se, porem, que seu litoral é uma
vasta fonte petrolífera; isto, juntamente com seus grandes reservatórios de gás
gerou a desmedida ambição de explorar tais riquezas: de um lado os países
liderados pelos Estados Unidos e de outro lado a Rússia.
Eis, portanto, o motivo fundamental
de toda a interminável guerra civil, que estava chegando ao fim, com a vitória
de um governo apoiado pela grande maioria do povo sírio. Aí então, sob pretexto
de fulminar fabrica de armas químicas, que estariam sendo utilizadas contra os rebeldes,
uma colisão liderada pelos Estados Unidos, com participação da França e Reino
Unido, passou a bombardear os arredores de Damasco.
Tal pretexto foi utilizado no
desencadeamento da segunda guerra, contra o Iraque, que se verificou,
posteriormente, ser uma grande farsa. Não é crível que o governo Sírio já
praticamente vitorioso contra seus opositores tenha utilizado armas químicas.
Na verdade, o império anglo-americano
mais uma vez está agindo em prol de seus interesses, juntamente com a França, uma
terrível algoz da nação Síria no passado, para evitar a consumação do triunfo
do governo numa guerra que já estava terminando. É uma grande hipocrisia
afirmar que as potências ocidentais estariam agindo por solidariedade humana
para proteger a população civil e suas crianças.
Com grande razão a líder norte
americana Helen White, ao afirmar no seu livro “O Grande Conflito”, que os
Estados Unidos são o símbolo bíblico da besta apocalíptica, que tem chifre de
cordeiro, mas age como dragão, sobretudo agora sob a tirânica chefia de Trump.
Tal afirmativa parece muito autêntica,
levando-se em conta o desnecessário bombardeio atômico no Japão, no final da
segunda grande guerra, cujas consequências ainda perduram nos dias atuais, e
outras atrocidades, sobretudo na criminosa guerra do Vietnam, onde houve um
grande uso de armas químicas.
Por outro lado, não se pode
justificar a participação russa no conflito, interessada que é na exploração do
petróleo sírio, mas é de se levar em consideração que uma antiga amizade une os
dois países desde o regime imperial dos czares, quando este retaliava o domínio
turco que, auxiliado pelos ingleses, jamais permitiu o controle da Rússia aos
estreitos de Bósforo e Dardanelos- um velho sonho nunca realizado.
Durante o império otomano, sob
comando da Turquia, a igreja católica ortodoxa russa mantinha escolas particulares
na Síria para acolher os filhos de famílias cristãs discriminadas pelo regime turco.
Um ilustre imigrante sírio Jad
Salomão (meu tio avô por afinidade) foi inspetor dessas escolas. Teve que
deixar o país, em face da perseguição turca, sobretudo após o fracasso russo na
guerra de 1905 contra o Japão que resultou no início do fim do império czarista
e se constituiu em uma das causas da eclosão da revolução Bolchevique de 1917:
o mais notório e discutível acontecimento do século passado, como bem analisou Orivaldo
Jorge de Araújo, em excelente artigo sobre o assunto publicado neste blog em
20/10/2017 sob o título, “Cem anos da revolução russa: os motivos que levaram a
sua eclosão”.
O referido imigrante veio para o
Estado de Goiás no Brasil, onde exerceu o comércio de tecidos na pequena cidade
de Goiandira e, posteriormente, veio residir em Anápolis, onde, como industrial
na atividade cerâmica, forneceu telhas para as primeiras construções de Goiânia,
a nova capital, em seus primeiros tempos.
Concluindo, torna-se imperioso
considerar que a indevida intervenção anglo-franco-americana, além de pôr em
risco a paz mundial, prorroga a duração de um conflito, com mais mutilações,
mortes e refugiados que o Reino único, França e Estados Unidos nunca quiseram
amparar.
Excelente texto.Do melhor que já aqui vimos sobre a matéria. Fez bem lembrar; as escusadas bombas atómicas e as milhares de napalm sobre o Vietname dos criminoso e hipócritas que agora perpetuam a guerra na martirizada Síria e por ela choram lágrimas de crocodilo.
ResponderEliminarTambém apreciei muito, quer a forma quer o fundo; apesar de longo, foi escrito por quem sabe e tem respeito pelo leitor, e é uma lição para quem aqui coloca "bosteiros" intragáveis, compactos, sem espaços que permitam ao leitor "respirar"...
ResponderEliminar