Tenho-me divertido a ver novelas turcas num canal televisivo espanhol do grupo privado Atresmedia, cuja programação é inteiramente preenchida com filmes e novelas, e fico na dúvida se aquilo que vejo passará na Turquia, país de tradição muçulmana no que concerne à liberdade das mulheres, cuja modernização por padrões europeus, desde que Kemal Ataturk derrubou o Sultão e fundou a república, o actual presidente tem feito regredir em muitos aspectos, razão das reticências que lhe têm sido colocadas na adesão à União Europeia, apesar de ainda se manter mais ou menos comprometido com a Nato.
Como o outono chuvoso me tem forçado a ficar mais tempo encafuado em casa, ao fim da tarde faço companhia às mulheres a ver aquilo, e surprendem-me não só a qualidade interpretativa naquele género, com excelentes actores de todas as idades, mas ver as raparigas e até mães de família com as mais modernas vestimentas, que não ficam a dever nada às mais atrevidas europeias e americanas; e jovens ricos, de ambos os sexos, frequentando juntos estabelecimentos de diversão noturna, apanhando grandes “porres”, conduzindo embriagados automóveis das mais famosas marcas, razão por que me interrogo se aquilo não será só para exportação, coisa que, de qualquer modo, revela uma sociedade cheia de contradições.
Escrevia há dias um repórter do JN, em serviço no Catar, que ao fazer a inscrição nos alojamentos destinados aos visitantes adeptos do futebol,os turcos se declaram cristãos, para poderem consumir álcool, vício que o islão proibe aos seus crentes, rigor que talvez o faça ainda mais apetecido; tenho um vizinho que, quando novo, foi emigrante em França, onde conviveu no trabalho com argelinos e marroquinos, e contou-me que repartia o alojamento com um argelino que fazia um esgar de nojo quando o via comer carne de porco, mas vendo a satisfação do português a comer aquilo, um dia aceitou a oferta e gostou tanto que, a partir daí, passaram a comer juntos, sempre que a refeição metesse aquela carne, mediante a garantia do nosso compatriota que não o denunciaria...
Amândio G. Martins
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