Só podia estar doida!
Maria Adelaide Coelho da Cunha era filha de Eduardo Coelho,
fundador do Diário de Notícias; era uma mulher viajada, rica e letrada e
tornara-se uma figura incontornável da alta sociedade do início do século XX,
depois de casar com Alfredo da Cunha, poeta e ensaísta, que herdara por dote a
administração e direcção do jornal.
O jornalista Ricardo J. Rodrigues conta, na Notícias
Magazine, parte desta história intemporal, passada há cem anos como podia
ter-se passado há cem dias.Uma herdeira rica, aborrecida da vida que
levava, decidiu fugir para bem longe de
casa, ao encontro do ex-motorista da família, 22 anos mais novo, por quem se
tinha apaixonado, e começar a viver a sério. Descoberto o seu paradeiro, foi
internada compulsivamente num manicómio porque, pelos padrões da época, só
podia estar louca.
Na desarrumação caótica em que se encontram os meus livros,
não consegui encontrar o que procurava, mas tenho ideia que Joaquim Paço
D´Arcos, num dos seus romances, tratou este tema, ou outro com os mesmos
ingredientes...
A jornalista e historiadora Manuela Gonzaga publicou uma
investigação detalhada sobre o livro “Doida Não e Não!”, que Maria Adelaide escreveu
para desmascarar a trama de que foi vítima,e
vai ser reeditado pela Bertrand. “Mesmo que tenha passado um século –
diz Manuela Gonzaga – o livro fala de violência doméstica e de machismo, de
corrupção e de bullying”.
Para poder vender o Diário de Notícias, o marido decidiu
interditar Maria Adelaide, para o que corrompeu três reputados especialistas,
acima de qualquer suspeita: Júlio de Matos, Egas Moniz e Sobral Cid, que lhe
diagnosticaram uma “loucura lúcida”, sem sinais de demência, mas um
comportamento moral impróprio e um historial de depressões que apontavam as
evidências. Aquela mulher, que tudo abandonara para fugir com um criado, só
podia estar louca...
Amândio G. Martins
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