Fernando Namora
Ganhei desde cedo o hábito de rubricar e datar cada livro, acabada
a sua leitura, o que me permite agora poder dizer que acabei de ler “O Trigo e
o Joio” em 24.06.1974. Ao anunciar neste livro “8-ª edição, 30-º milhar”, a
editora mostra-nos quão limitado era o
consumo de livros no nosso país, razão decerto da citação que Namora faz, no
início deste seu livro: “O mundo da literatura é, porém, um triste mundo”.
Em tempo de homenagem a Fernando Namora, permito-me
transcrever alguns apontamentos das sete páginas que Jorge Amado dedicou a este
livro no seu Prefácio:
“Aproveito a oportunidade da publicação de uma nova edição
de “O Trigo e o Joio” para expressar
toda a minha antiga e sempre renovada admiração por seu autor, o
romancista Fernando Namora, mestre do romance. Um mestre do romance cujos
livros, como este e como “Domingo à Tarde”, seriam grandes e importantes em
qualquer língua e em qualquer tempo.
Esses livros estão rompendo as fronteiras de nossa língua,
ainda tão restringidora das possibilidades de seus escritores por serem pobres
nossas pátrias e de pequena presença económica num mundo de grandes potências. Ainda
há poucos dias, um grande editor brasileiro me dizia:”Vende-se tudo, qualquer
autor, desde que não seja português ou latino-americano”. (...)
Se exceptuarmos o poeta Fernando Pessoa, em matéria de
literatura portuguesa paramos ne geração de Eça. Dos autores portugueses
contemporâneos, só Ferreira de Castro é dono de grande público, mas Ferreira de
Castro é considerado autor brasileiro e lido como tal. Os demais, mesmo um
Aquilino, têm seu nome e sua obra conhecidos apenas de intelectuais. Exceptuo
dois nomes: Miguel Torga e Fernando Namora. As obras desses dois grandes
escritores conseguiram romper inclusive o muro erguido pelos professores de
Literatura Portuguesa entre o público e essa literatura que eles deviam
divulgar. Torga e Namora possuem hoje leitores brasileiros mais além do círculo
de privilégio dos intelectuais.
Namora escreve bem e escreve do que sabe e conhece, como se
ele fosse o igual desses camponeses, dessa rude gente misturada com a terra e
com os animais. Sabe tudo sobre eles, mas sabe de um saber de vida vivida, não
de observação, não de quem viu, mas de quem viveu; eles são carne da sua carne.
O Trigo e o Joio é como uma sinfonia grave e profunda, mas não sei porquê, em
sendo quase trágica, não é triste a história.
É uma cruel condição de homens, um drama de gente dura e
tensa; a mim por vezes me arrepia, mas não me traz nenhum sentimento de
piedade. São homens e mulheres talvez desgraçados em seu novelo de pequenas
ambições e terríveis desejos, mas em sua desgraça conservam uma certa grandeza,
que é igualmente o cerne da grandeza do romance, numa narrativa onde cada
palavra é a justa, onde o substantivo despido de enfeites é a própria terra do
Alentejo. Tão poderoso o instrumento do romancista que eu, leitor de um país
distante, me senti alentejano”.
Amândio G. Martins
“ O mundo da literatura é, porém, um triste mundo” - cabe a nós , leitores lusos, melhorarmos os hábitos de leitura das nossas crianças, para que percebam quão mágico pode esse mundo ser!
ResponderEliminarVivemos tempos em que , felizmente, podemos ter acesso a todos os escritores , nacionais ou não ...
Prefiro sempre olhar o copo meio cheio, e ter esperança que se pode mudar sempre para melhor !
Inteiramente de acordo...
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