quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Portugueses na construção de Brasília

 

Portugueses na construção de Brasília...

 

 

Um recente texto do professor Orivaldo, de homenagem a Kubitchek de Oliveira, puxou-me a curiosidade para reler o que sobre aquela capital do Brasil havia dito o “nosso” professor Agostinho da Silva, estudioso com muitos anos de Brasil, numa entrevista publicada pelo ICALP no livro “Dispersos”.

 

P -Esteve em Brasília, na altura da construção?

 

R- Estava lá, andei por lá e depois fiquei por lá ainda uns tempos. E posso dizer-lhe que Brasília foi a coroação de todos os  movimentos portugueses para a construção de um Brasil. Foi a última coisa que os portugueses fizeram. E já vou justificar.

 

P-Mas Brasília foi uma construção de Kubitchek! Não foi ele que avançou com a ideia?

 

R-Pois, é claro, mas o Kubitchek era brasileiro e o facto de ter um sobrenome checo não significa nada. O Brasil amolda as pessoas. Todo o estrangeiro que chega, ao fim de uma ou duas gerações é brasileiro. O que houve é que o Português procurou sempre alargar o Brasil e vê-lo de uma forma racional. É do século XVIII, e não de 1950 ou 60, a ideia de criar uma capital que não fosse, como se dizia, caranguejando pela costa.Uma capital que não tratasse só do Brasil litoral, que tratasse de toda a extensão do Brasil, do litoral aos Andes. Portanto, pôr a capital mais ou menos no centro. Realizar isso era extremamente difícil por todas as resistências das pessoas que queriam continuar ao longo da costa, por toda a dificuldade de penetrar no interior.

E qual foi o grande mérito de Kubitchek? Foi ele que ousou, sozinho, lançar a ideia de ser ele a executá-la. Depois de marcar o lugar que seria bom para a capital, um planalto, com boa temperatura e possibilidade de acesso, resolveu-se que a cidade começasse ali. E esta é a razão pela qual Brasília é, fundamentalmente,  uma cruz: é que Lúcio Costa, quanto teve que dizer que a cidade seria naquele local, pegou num plano, como toda a gente faz, e marcou num mapa a cidade com uma cruz.

                                                            (...)

Agora vou dar-lhe um pormenor importante, e esse foi o Lúcio Costa que me disse: quando teve de se fazer a construção de Brasília, o material humano que havia ao dispor era engenheiros e arquitectos -  magníficos! – do Sul do Brasil, e para se lançar a obra, para construír, a gente que vinha era do Nordeste, quase tudo analfabeto, sem nunca ter tido contacto com aquelas técnicas. Então o entendimento entre os dois grupos era extremamente difícil. Aí, disse-me Lúcio Costa, interveio uma força extaordinariamente importante, que se poderia chamar de tradução sumultânea. Houve homens que explicaram aos nordestinos ignorantes o que queriam dizer os sapientes engenheiros e arquitectos. Sabe quem eram eses homens? Eram os mestres-de-obras portugueses lá emigrados, formados por escolas do tipo da Machado de Castro.

 

 

Transcrito por Amândio G. Martins

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