Há males que vêm por bem. Não obstante as tragédias
acontecerem e dar-se-lhes enterro logo após os lamentos, é vulgar o aparecimento do aproveitamento
das desgraças, e fazer melhor condição de vida à custa do que já não tem
remédio e por isso remediado está. O choradinho acabará por provar que quem não
chora não mama, e entre nós, gente de lágrima fácil, hipócrita e cínica quando
convém, resulta, apresentar facturas extrapoladas por perdas que tiveram lugar
e são escombro, e sobre bens que nunca existiram. Agora, que as labaredas
amansaram e até foram extintas, vão surgir reivindicações de indemnizações por casebres
abandonados e destinados a redis ou que serviam para guardar tralhas sem
préstimo, até mesmo vazias como se via pela TV, e que de repente foram habitações
com almas dentro, vivendas ao sol, casas senhoriais, solares, todas recheadas
de mobiliário antigo, relógios de parede com horas certas e conservadas,
equipadas outras com o mais sofisticado e último grito tecnológico. Maquinaria
que era ferro-velho, abandonado, e que não passava de ferrugem amontoado a um
canto, será apontado na lista de artigos a apresentar como indispensáveis, e
que devem ser compensados por quem vai ter a tarefa de indemnizar a qualquer
preço. Gado que não pastava nem balia, nem zurrava, feito torresmos. Terrenos
que estavam a mato e a monte, serão definidos como verdejantes quintas, belos
pomares, que davam frutos saborosos, paradisíacos, e que agora por via dos
incêndios malditos e assassinos, surgem carvões, cinzas, e murchos sem
utilidade para consumo próprio e muito menos para colocação no mercado.
Prejuízos enormes vão ser declarados para fazer abrir os cordões à bolsa por
quem governa, e desbloquear as verbas das quais há pressa, umas doadas pela
fraternidade e solidariedade do bom povo, outras as que hão de completar o
montante necessário a satisfazer as vítimas e as oposições partidárias. O
negócio está em marcha e a arder. Alguns e alguém, acabarão melhor do que
estavam, na véspera, de tais vespeiros levantados pelas línguas de fogo
infernais que assolaram, vilas e aldeias, deixando rasto de prejuízos com
sacrifícios suportados em cima das feridas, mas também oportunamente
aproveitados, como se verá, por quem saberá fazer negócio por entre a maré e o
braseiro ruidoso e trauliteiro, que se vive entre autarcas, corporações, e
partidos políticos, à espreita para entalar o governo da nação, e sacarem o
mais que puderem. A democracia também é a arte do vale tudo. A vilanagem sabe
como actuar, mesmo se os cadáveres ainda andarem a ser contados!
É claro que todos/as lamentamos as vidas perdidas. Primeiro, evidentemente, as humanas. Mas também as dos ditos irracionais e até as vegetais. Depois, há também os aproveitamentos que o amigo Joaquim no seu estilo inconfundível e que tanto prazer nos dá ( a mim dá!) ler. Grandes desgraças. Pequenas sacanices.
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