O universo desabou numa sala anónima de um aeroporto e eu
protejo com um abraço a minha família: a minha mulher, o meu filho. Protejo-os
para a vida. Não percebo o que está a acontecer, uso-me do instinto, a minha
lucidez.
Não dou ao meu filho tempo para chorar, e é disso mesmo que o
protejo, para que não chore. Se o fizer, ficará para sempre impedido de ser
ingénuo, perde a sua naturalidade, tão pequeno ainda, impedido de futuro numa
sala anónima salpicada de corpos inertes à sua volta, a pior vilania que a vida
lhe pode oferecer.
Vou trazê-lo para a rua, disfarçando como se nada fosse, de mão
dada os três, e quando chegarmos a um ar que se respire, vamos comer um doce,
vou dar-lhe um brinquedo que goste sem olhar a custos, beijarei a minha linda
esposa, e continuaremos a viver, com novos medos, mas atentos a que ele não chore
nunca.
Chorar é o que eles querem ver de nós, que sejamos tristes.
Mas com o meu filho, não. Enquanto nos beijarmos e nos
abraçarmos com esta energia avassaladora, que é o amor, eles serão sempre uns
pobres de uns enjeitados.
Pudéssemos, eu, a minha amantíssima esposa e o meu radioso
filho, abraçá-los com este abraço que sabemos dar, eles não pintariam de escuro
os dias de sol.
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