PÚBLICOEDIÇÃO PORTO SÁB 5 MAR 2016 Edição especial 26.º
aniversário
Tão difícil alguém assumir um “erro”...
Estamos a viver num tempo em que a vontade de nada respeitar
é o mais alto desígnio de todos e de cada um de nós. Desde que nos convenha, fazemos
tudo o que nos apetece, a começar pela condução automóvel e pela forma como
colocamos o “eu” umas dez vezes antes do “tu”, que é assustadora.
Para além de que vivemos num tempo em que todos achamos, desde
a pessoa mais importante deste país à menos, que “isto não vai bem”, mas é
sempre e só culpa do “outro”. Aqui, o “eu” é tão forte e tão excepcional que em
nada tem culpa. Faz sempre tudo bem, tem sempre razão.
Daí palavras como “desculpe” já estarem quase a não existir
nos dicionários, não se usam!
Os outros, os “tu” e “vocês”, é que são culpados das
confusões, das trapalhadas. De tudo o que seja incorrecto.
Eu, nunca.
E quando se apercebem — nos apercebemos — de que existem “culpados”
e que ajudamos a que tal aconteça, por acção ou omissão, muda-se de conversa,
destrocam-se os argumentos, ou arranja-se um “alvo” predilecto, por norma o que
está a “levar” na ocasião e é culpado — nunca provado — de tudo. (...)
Ainda estará para vir o dia em que alguém, no mais pequeno
detalhe ou em algo de muita relevância, e conforme o caso de forma privada ou
pública, assuma que se sente culpado. (...)
Nunca vemos, por exemplo, uma mãe assumir que educa mal o filho,
e se já tem a hombridade de assumir que ele — fihote, coitadinho — é um pouco
selvagem, a culpa é do marido, dos avós, do ambiente da escola, nunca da
própria.
Não vemos um governante dizer “errei”. Não vemos ninguém assumir
que, como humano, se engana, erra e que por isso “algo” funcionou menos bem e vai
ter de ser alterado o trajecto.
Não vemos numa empresa, um responsável máximo numa situação de
complicação, dar a mão à palmatória quando errou, nunca, são todos intocáveis.
Somos sempre nós, o “eu” dono e senhor do saber e da razão.
Nunca podemos sequer achar que tivemos culpa. E dormimos bem
com “isto” de só o outro ser culpado e nós sempre inocentes ou inocentados.
Seja!
Augusto
Küttner de Magalhães, Porto
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