Devemos já ter ultrapassado (pela direita) o milhão de desempregados. Os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística avalia-os em 950 mil no primeiro trimestre deste ano, ou seja, 17,9% da população portuguesa. Houve, portanto, um aumento percentual de 0,8 em relação ao trimestre anterior. Estes números dão para tudo: para uma configuração experimentada de vivências dramáticas, mas também para o exercício cada vez mais requintado da retórica política. Neste último ponto, este flagelo serve tanto para o lado da maioria governativa e parlamentar como para os restantes partidos, sejam eles da esquerda moderada (seja lá o que isso for) ou de esquerda radical (o PP é de direita radical?). Todos são useiros e vezeiros no esgrimir argumentativo.
O último exemplo foi-nos oferecido hoje pelo ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, Marques Guedes. Diz então o ministro que estes números "são resultado natural de dificuldades profundíssimas que a economia portuguesa sofre em termos estruturais, que levou (...) ao programa de assistência económica e financeira". Eu pensava que o desemprego era fruto da vertente acelerada de austeridade que o governo está a impor à débil economia portuguesa. Segundo Guedes ("dificuldades... que levou... ao programa de assistência e económica e financeira"), parece que vivíamos ainda pior antes do resgaste financeiro. Provavelmente, ele não dará por isso, na sua vida particular; provavelmente, continua a não fazer contas à vida; provavelmente, até estará financeiramente mais regalado, provavelmente, passa pelos pingos da chuva sem se molhar... Mas o que passa, certa e lamentavelmente, o grau da incerteza é a vida destas centenas de milhares de desempregados, novos e velhos, jovens e menos jovens (outra área semântica de interesse geral e conveniente, o do desemprego jovem, seja lá o que isso for...). Estes não escapam à recessão. Viveram acima das possibilidades que auferiam, dizem-lhes.
Mas Marques Guedes tem uma solução para tudo isto (a retórica, a retórica...): a "única forma" de resolver o problema do desemprego", diz o ex-líder parlamentar, é por via "da resolução dos problemas económicos que o país tem".
Pobre ministro, pobre país... Um milhão de desempregados para resolver a economia do país!... Afinal, é só isso que Marques Guedes consegue alcançar.
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