domingo, 16 de dezembro de 2018


Dos calores da juventude...


...”Naná crescia, fazendo-se uma boa moça. Aos quinze anos estava completamente desenvolvida, uma pele aveludada como a do pêssego, uma boca de rosa e nos olhos um fogo tal, que os homens ao vê-los sentiam desejos de acenderem neles os seus cachimbos.

Agora já Naná não necessitava de meter bolas de papel no espartilho, pois os peitos tinham adquirido um regular desenvolvimento, cobertos por uma pele parecida com cetim branco finíssimo. E o que a tornava mais apetecível era o feio costume de mostrar a pontinha da língua por enre os seus brancos dentes.

Os domingos eram, naquela época, os dias de contacto de Naná com a multidão, com todos os homens que passavam e lhe deitavam olhares. Esperava toda a semana que chegasse o domingo, possuída de uma necessidade de ar livre, de passeios ao sol com as colegas entre a barafunda de um arrabalde em traje de festa.

A rua pertencia-lhes, nela tinham crescido, levantando as saias em frente  das lojas, arregaçando-se até aos joelhos para atarem as ligas. Naná ia no meio com o seu vestido cor de rosa, dando o braço a Paulina. E, como as duas eram mais mulheres e mais descaradas, dirigiam o bando e envaideciam-se com os olhares e dichotes que lhes deitavam. Próximo do pôr do sol, davam a última volta do passeio e regressavam, no meio da multidão fatigada. Depois, subiam às respectivas habitações, inventando uma historieta.

Agora Naná era oficial e ganhava quarenta soldos e os pais não queriam mudá-la de atelier. Todas as manhãs a jovem ia só e a patroa tinha o encargo de tomar nota da hora a que chegava para informar a mãe; às vezes era pontual, mas quase sempre chegava atrasada, o que levava a mestra a exigir-lhe que lhe contasse se tinha estado com algum homem.

Realmente, no atelier Naná completava uma educação admirável, aperfeiçoando-se  no contacto com aquele grupo de descaradas; ali estavam misturadas umas com as outras, a eterna história do cesto de maçãs, quando entre elas havia algumas podres. Ao ouvido umas das outras, eram muitas as obscenidades. E como se isto não bastasse às raparigas que, como Naná, ainda não tinham provado do fruto proibido, reinava no atelier uma atmosfera que a levava a querer estar junto daquelas que já tinham visto o bicho”...


Nota – texto compilado do livro anexo.


Amândio G. Martins




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