Eu sei que o pródigo e bondoso professor Agostinho da Silva
pertenceu a este mundo ausente de ostentações vãs, e longe, muito longe, das
vis mordomias, antítese de todos os concidadãos sem escrúpulos que depauperaram
e continuam a exaurir o povo e toda a nação lusíada.
Também sei que gostava muito de dialogar com o seu gato, o
qual, quase embevecido, o escutava sem enfado.
E eu, igualmente e no mesmo sentido, isso faço com os meus
felinos de estimação.
Do mesmo modo vivencial, de se dar atenção aos seres menores
que nos rodeiam, o saudoso Manuel António Pina, ‘por outras palavras’, também
vivia, prosando e poetando, rodeado de gatos.
Assim, no mesmo sentido de se gostar de animais de
estimação, vivem comigo o Brilhante, a Nina e a Tucha, além da dócil cadela
Teca e da Quica, a plumosa e alva rola, que me saúda todos os dias com os seus
ternos arrulhos.
O Brilhante é fulvo como um tigre loiro; a Nina, de rabo
retorcido, é a macia e ternurenta siamesa; a Tucha é um bicolor arlequim e uma
ex-sem-abrigo por amansar. Continua agreste, desconfiada e arisca.
Sobre gatos, Miguel Esteves Cardoso, isto escreveu com douta
sabedoria: ‘o que me espanta num gato é a maneira como combina a neurose, a
desconfiança e o medo – para não falar numa ausência total de sentido de humor
– com o talento para procurar e apreciar o conforto e, sobretudo, a capacidade
para dormir 20 em cada 24 horas, sem a ajuda de benzodiazepinas.
O gato é neurótico mas brinca. Mas, acima de tudo, descobriu
o sistema binário da existência. Que é: dormir faz fome. Comer faz sono. Acordo
porque tenho fome. Adormeço porque comi. Nos intervalos, faço as necessidades.
‘
E, pedindo desculpa da minha intromissão, esta prosa assim
completo: a diferença entre um cão e um gato é completamente oposta. Se o cão é
dependente, o gato é independente. Se o primeiro caça em grupo, o segundo caça
sozinho. Se o cão é subserviente e submisso, o gato é insubmisso q.b.
Mas, num ponto são iguais: ambos conhecem o dono. Todavia,
isso acontece de modo diferente: um, é um ser canino; o outro, é um puro felino
de trazer por casa.
José Amaral
Adorei!!! E nunca tive gatos...
ResponderEliminarMuito obrigado pela sua comunhão comigo.
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