Reconheço-me na herança judaico-cristã, mas não sou cristão, nem crente. Aliás, com o passar dos anos, cada vez são menos as coisas em que acredito e em Deus já deixei de acreditar há muito tempo. Isso não significa, obviamente, que não acredite no Bem e no Mal (por enquanto) ou que partilhe a opinião tão em voga de que tudo é relativo.
Acontece que o exemplo dos cristãos que fui conhecendo ao longo da vida, salvo muito raras excepções, em vez de me fazerem aproximar da Igreja, apenas contribuíram para que fugisse dela a sete pés.
E o Natal não é, infelizmente, uma quadra que abone muito em relação ao verdadeiro espírito do cristão. Basta entrar num centro comercial e ver toda aquela azáfama de cristãos a gastar o que lhes faz falta (a eles e a muita gente) num sem número de brinquedos, jogos e prendas absolutamente inúteis e que não vão contribuir, em boa verdade, para a felicidade de ninguém, para se ficar logo vacinado contra o espírito natalício e a cristandade.
Até hoje ainda nunca comprei uma prenda de Natal aos meus filhos. E também não vai ser ainda este ano. Espírito de contradição? Provavelmente, mas sobretudo porque gostava deles e tinha a perfeita consciência de que comprar um brinquedo a quem já tinha brinquedos em excesso era extremamente prejudicial para a sua formação.
E não só não lhes comprei brinquedos pelo Natal como os incentivava a desfazerem-se da maior parte dos que tinham e recebiam, mais que não fosse para poderem valorizar os brinquedos com que ficavam. Além disso, a selecção de brinquedos tinha ainda a enorme vantagem de fazer felizes outras crianças que não tinham brinquedos. Era o chamado efeito dois em um: fazia bem aos meus filhos, que se livravam de brinquedos inúteis e que literalmente os asfixiavam, e fazia felizes aqueles que os recebiam e que, por terem poucos ou nenhuns, lhes davam uma atenção que na minha casa seria impossível de encontrar.
É verdade que, de vez em quando, ainda se vê e ouve por aí uma alma caridosa em campanha de recolhas de brinquedos usados para distribuir pelos infelizes. Mas, em regra, estas campanhas são aproveitadas pelos cristãos apenas com a finalidade de libertar espaço em sua casa para que esta possa receber a nova colecção de inutilidades que já não incluem apenas brinquedos, mas uma série de jogos, equipamentos e adereços quase sempre tão caros quão perniciosos. Hoje em dia uma família cristã já não consegue viver sem atafulhar os quartos dos seus jovens rebentos com doses maciças destas inutilidades. O excesso de brinquedos atrofia a imaginação e amolece o carácter. Mas quem não tem tempo para os filhos têm de os compensar com alguma coisa. E pelo número de brinquedos e jogos de uma criança, facilmente se avalia o tempo que os pais lhe dedicam.
Para quem não saiba, é muito fácil distinguir um bom pai de um mau pai: o bom pai faz o que tem de ser feito porque gosta dos filhos, o mau pai faz o que for preciso para que os filhos gostem dele. Não é fácil ser um bom pai. Por isso, há tão poucos.
reconheço-me como cristão, tento sê-lo, e não me revejo no que escreveu.
ResponderEliminarO artigo do Dr. Santana-Maia Leonardo, pessoa por quem tenho consideração, está um pouco emaranhado e tem algo de confuso na sua conclusão. Com prendas ou sem prendas desejo-lhe um BOM NATAL.
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