Em cada ano um outro Natal. Uns chamam-lhe novo, outros,
evento religioso(!), que se repete. As ruas tentam dar-nos música celestial até
que os anjos acordem e nos incitem ao caminho do consumo. As montras das lojas
animam-se de brilho e de invenções, exibindo luzes e vestindo-se de cores
renovadas, que já antes por lá passaram. O povo hesita mas lá acaba por sair à
rua. Conta os trocos antes de bater com a porta, olha à sua volta e conta
também quantos são os que esperam qualquer coisa que dê significado à festa. E
lá seguem todos numa romaria da preocupação, que no regresso já sabem que vai
seguir-se a da amargura por afinal os gastos terem ultrapassado o previsto e o
orçamento, que já vinha derrapando faz tempo. Mas o natal tem este condão. O de
fazer com que pobres e ricos, se misturem, quase se irmanem. Uns mais à larga
nas despesas puxando de notas gordas, outros com mais furos no cinto desafinado
para fazer logo que o último bocado de bolo-rei tenha passado garganta abaixo,
e que, mais magros de carteira vão continuar, no fim. Uns mais animados
festejam ladeados de Dom Pérignon, outros de um qualquer espumante de tostão
comprado na mercearia do bairro, para não ficar atrás. De imitações também vive
o homem. As autarquias esmeram-se para o tornar eufórico e bastante comercial.
A música persistente e a iluminação intermitente, municipal, que vai desde a
rotunda até ao zimbório da capela, vão adormecendo e anestesiando a razão sem
se dar por isso. O comerciante já não vem tanto à porta a ver quem passa. Tem
artigo à venda que ainda irá sobrar para fazer felizes outros natais que hão de
vir. O povo passa numa correria com os sacos a abanar, e ainda tem muito para
espreitar. Pelo caminho vai fazendo uma revisão da lista mental, sobre quem
falta e quem este ano não leva nada. Contenção e austeridade é preciso, e ele
já foi bombardeado vezes sem conta com este discurso. Tem o saco cheio
destes avisos, já que de cofres em bom
estado, não é com ele. A noite acender se à com a alegria de muitos putos bem
tratados, e a fé que o terço das contas
põe nas mãos das famílias humildes, acompanhará a esperança de que dias
melhores virão para que estas possam mais tarde, também fazerem felizes as suas
crianças que se contentam com pouco ou contrariadas. O Natal tem destas
Orações. Difíceis de soletrar!
Sem comentários:
Enviar um comentário
Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.