A "memorização está de volta como um dos motores da aprendizagem".
Mas esta tem que ultrapassar a disciplina da Matemática.
Reconheceu-se, «mais vale tarde que nunca» - esperemos que para ficar, que a memorização faz parte da aprendizagem.
A repetição tem de voltar a ser uma prática na aprendizagem. E os professores devem explicar aos alunos a importância da memorização.
Enquanto professora de Piano é isso que «professo» todas as aulas. A libertação que vem de saber de cor, saber do coração, uma passagem, uma obra musical.
É, portanto, um tema que me é caro.
George Steiner, professor e pensador incontornável do nosso tempo, escreve, em qualquer dos seus livros, sobre a importância de memorizar: " Mas a memória - a «Mãe das Musas» - é precisamente o dom humano que possibilita a aprendizagem. (...) aquilo que sabemos de cor amadurecerá e desenvolver-se-à dentro de nós. O texto memorizado interage com a nossa existência temporal, modificando as nossas experiências e sendo dialecticamente modificado por elas. Quanto mais vigoroso for o músculo da memória, melhor protegido estará o nosso ser integral. (...) Por tudo isto, a rejeição da memória no actual sistema escolar é de uma flagrante estupidez. ( As Lições dos Mestres, Gradiva, 2003)
Mas sem repetição, não há memorização. («Mas é chato» - dizem).
Escreve Erwin Schorödinger, o Nobel da Física em 1933: "A perda gradual da consciência reveste-se de primordial importância para o conjunto do processo de aquisição de prática através da repetição. (...) Uma simples experiência que nunca mais se repita torna-se biologicamente irrelevante." Para aprender seja o que for, é necessária a repetição, várias vezes, em numerosos casos, periodicamente, requerendo sempre a mesma resposta, para que o organismo se mantenha firme. (
O que é a Vida?, Fragmentos).
É preciso ensinar toda a relevância da memorização, do saber de cor.
E para terminar, novamente Steiner: "tudo o que não aprendemos e não sabemos de cor - adentro dos limites das nossas faculdades sempre imprecisas - é aquilo de que verdadeiramente não gostámos".
(
PÚBLICO, 27-4-2013)
Sempre defendi a necessidade das crianças terem uma minima noção do "valor" das contas que estavam a fazer pois sem essa noção não sabem se a continha da máquina corresponde ao valor que procuram. Obriguei sempre os meus netos a fazerem contas de cabeça, a contar pelos dedos. Coisas de velha. Mas são alunos de 5 a matemática e agora acima dos 15.
ResponderEliminarConcordo inteiramente! Também eu repetia vezes sem conta passagens difíceis no piano, para que os dedos ficassem "automáticos" e os olhos os seguissem a eles, não as notas da partitura; vezes sem conta a mesma música, para que a pudesse interpretar à minha maneira, "livremente", sem que o papel posto diante dos meus olhos atrapalhasse a leitura interior.
ResponderEliminarFaz-me confusão que para cálculos simples as "novas gerações" recorram à máquina de calcular (concordo consigo Clotilde).
Fala-se aqui dos textos, de facto um poema será tão mais sentido quanto de cor esteja, quando está já no coração e não na razão de quem o declama; o mesmo com os discursos. Às vezes acho ridículos os discursos políticos que se "querem" inflamados e sentidos mas... o seu declamador continua a ler o papel em vez de nos mostrar que sente verdadeiramente o que lá está. Quando se sente, vem do coração, e esse, sabe de cor, não lê!
Desprezar a memória, penso, é desprezar parte de nós, porque esqueceremos facilmente quem fomos, de onde vimos e assim, perderemos o rumo que queremos seguir.
Toda a razão do mundo para o artigo e para os comentários. Só que a realidade transportou-nos a outro plano do conhecimento, não porque eu defenda ou concorde com essa situação, mas porque a experiência e a vivência nos locais próprios fazem de mim testemunha dos factos. Como professor estive décadas no ensino oficial e nos intervalos, nas salas de convívio, os docentes mais novos, das mais diversas disciplinas, especialmente na área de Letras, achavam muito giro perguntarem uns aos outros coisas do género; olha lá ó fulano, 9 x 7, são quantos?
ResponderEliminarEsta geração, mesmo de professores, não foi formada a cultivar a memória e, daí, vai ser difícil recuperar o tempo perdido. Isto é muito mais profundo que a simples enumeração dos números, é, sobretudo, uma desvalorização da memória que, em última análise, vai desvalorizar a história.
Tenho muita pena Sónia de lhe dizer que não consigo - nunca consegui - decorar muita coisa e por isso nunca fiz teatro. Poemas também só com papel à frente embora tivesse docrado a tabuada, as serras e rios de Portugal e caminhos de ferro.
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