O preceito
evangélico – dar a César o que é de César – não pode ser entendido apenas
literalmente, mas compreendido em seu amplo conteúdo de justiça, tal como foi a
intenção do Mestre dos mestres – o Cristo cósmico encarnado em Jesus, ao
responder capciosa pergunta dos fariseus, se devia ou não o povo pagar tributos
aos dominadores romanos.
Trata-se de
uma resposta inteligente diante do dilema em que se viu envolvido: ou dizer sim
e incompatibilizar-se com o povo revoltado contra o pagamento dos impostos de
César ou falar não e tornar-se réu perante as leis romanas.
Jesus não
saiu pela tangente, como muitos pensam, ao contrário, posicionou-se
profundamente em sua aparente evasiva. Vendo a efígie do imperador na moeda que
lhe foi exibida, disse que ela fosse devolvida ao seu dono, isto é, a César, a
quem ela realmente pertencia, como as coisas de Deus que a este devem ser
restituídas.
Na verdade,
o dinheiro só pode ser validamente feito pelo governo; coisa de governo,
portanto. Com ele é que se pagam os tributos, dos quais, igual a morte, ninguém
se livra, conforme ensinamento do pensador e cientista norte-americano Benjamin
Franklin. Por isso é bom nada ter, para que nada nos possa ser tirado. “Eu
morro todos os dias, e é por isso que vivo” – eis o ensinamento do apóstolo
Paulo na chamada grande Epístola, a primeira que escreveu aos Coríntios.
O Profeta
de Nazaré não afirmou, entretanto, que toda a cobrança de César seria justa ou
legal e tampouco lhe negou o direito de receber tributos, sobretudo na Judéia
Rebelde, onde, ao contrário de outras regiões da antiga Palestina com seus
“reis” dóceis e submissos aos senhores do Império, Roma mantinha governo
direto, daí a necessidade de obter recursos para custeio da administração e dos
serviços públicos.
Pagar
impostos é um dever de todo cidadão, mas a lição de Jesus se volta no sentido
de pagar apenas o que se deve. Nos países do terceiro mundo, entre os quais se
encontra o Brasil, há muita exigência indevida, além da grande injustiça do
leão do Imposto de Renda que devora a classe média assalariada e continua
complacente com os ricos.
Mesmo em
países de cultura mais desenvolvida, inclusive Portugal, a carga tributária
pesa muito sobre a sociedade, merecendo por isso, ser objeto de uma
substanciosa reforma.
Não se
pode, pois, acomodar-se diante das investidas dos césares modernos – governo
federal, estadual e municipal – que, impotentes no combate à corrupção, lançam
mão de todos os meios para arrecadar numerário no saco sem fundo de
administrações falidas, visando à manutenção de uma pseudo democracia, que
exige muito recurso destinado aos Poderes, sobretudo o Legislativo com seus
parlamentos cheios de um excessivo números de integrantes, quase todos
descompromissados com o povo, porquanto, na verdade, são lacaios de
empreiteiras que sugam a nação no total desplanejamento das obras
superfaturadas.
Quantas
ações na esfera do Judiciário têm sido propostas pelos cidadãos vitimados pelos
desmandos dos césares contemporâneos.
Mahatma Gandhi,
o crístico que não foi cristão, em seu mais autêntico pacifismo, proclamou a
desobediência civil contra as leis injustas do colonialismo britânico na Índia,
que pretendia proibir o povo até de tirar sal do mar e tecer suas próprias vestes,
tal como fez no Brasil, quando destruiu a tecelagem de Delmiro Gouveia,
atirando suas máquinas na Cachoeira de Paulo Afonso.
Pela mesma
forma, o verdadeiro cristão não pode acreditar que o senso de justiça do “dai a
César o que é de César” seja conspurcado para justificar o desrespeito dos
governantes ao direito do povo.
É preciso
cuidar das coisas espirituais, dando a Deus o que é de Deus, na prática da solidariedade
humana em seu mais amplo sentido, mas o reverso da moeda, ou seja, o “dar a
César” das coisas materiais deve ser
tratado com a máxima cautela, numa luta pacífica e sem tréguas contra as
injustiças do Estado, que deve existir para o cidadão e não este para aquele.
Vivaldo
Jorge de Araújo, ex-professor de História e Língua Portuguesa do Lyceu de
Goiânia, escritor e agente aposentado do Ministério Público no Brasil.
Meu Caro Irmão,
ResponderEliminarDo outro lado do Atlântico, não da barricada, estou consigo e sigo os seus ensinamentos cesarinos.