Os filhos da
“cadeirinha”
Os actos de violência, praticados
interpares, por crianças e jovens que, ultimamente, tem chegado ao conhecimento
público, sendo alguns perpetrados com uma dose incrível de malvadez, deviam
merecer uma profunda reflexão pelos mais altos responsáveis da nação.
Os ministérios da educação,
segurança social, administração interna e da economia, em princípio, deviam
aprofundar a sua missão e não viver da espuma dos dias, e encontrar um caminho
para assegurar um viver decente para o povo deste país. As crianças são o maior
valor duma nação. Elas são merecedoras de toda a atenção e carinho, em todos os
momentos da sua vida. Em vez de aumentar os horários de trabalho dos pais,
deviam reduzi-los enquanto os filhos deles precisassem. As crianças são o
futuro, e o futuro constrói-se no presente. Quem descura a obrigação de
proteger e manter uma terna relação com as crianças está confundido e ajuda a
propagar problemas sociais no amanhã.
Uma sociedade que tem como único
objectivo final o lucro, ou seja a acumulação do capital, não pode respeitar o
cidadão. O objectivo final tem de ser o bem social, ou seja, o bem do cidadão.
Mas o cidadão começa a partir do parto, ou seja, do nascimento.
Na sociedade moderna, onde as
famílias se desmoronaram, onde os avós, que antes estavam em casa, agora estão
nos lares de idosos, onde havia um cantinho para um tio idoso e hoje não há, os
pais, porque têm ambos de trabalhar para manter o equilíbrio das despesas
familiares, têm, logo de manhã cedo, de retirar a cadeirinha do carro, e
entregar a criança no jardim-de-infância. Esta meio-adormecida, olha agora a
cara da recepcionista, que não é a da mãe e, daí a algum tempo, vai para a sala
dos bebés da sua idade. Quando desperta, para tomar o biberão, já é outra
pessoa que encontra à sua beira, ou é a auxiliar ou a educadora de infância. A
criança sente em si a necessidade de criar laços afectivos e investe nas
pessoas que lhe estão mais próximas. Mas, infelicidade das infelicidades,
quando já sente uma aproximação afectiva, é mudada de sala e novas caras se lhe
apresentam e, assim, sucessivamente durante alguns anos. Foi sucessivamente traída
na sua inocência, porque investiu amor e foi defraudada. Agora dificilmente
acredita em alguém e, nalguns casos, pode tornar-se rebelde, embora, na sua
fragilidade, não consiga ainda extrapolar a sua revolta. Algumas destas
crianças, anos depois, em espaços de mais liberdade, onde podem projectar o
desamor acumulado, se não lhes for possível agredir os mais velhos, agridem os
que estão ao seu alcance.
Sem ir à raiz dos problemas eles
não têm solução, pois remendos não curam. Achamos interessante, os comentadores
encartados, dizendo banalidades e lugares comuns sempre que sucedem casos de
grande repercussão, sem saírem do círculo vicioso, recomendam os institutos de
internamento de menores, donde, infelizmente, muitos saem piores de que quando
entraram. Diz Ortega Y Gasset, e essa frase está sempre a ser citada, que há” o
homem e as suas circunstâncias” e digo eu, modesto cidadão, que para
ultrapassar a crise social com que nos debatemos, o “homem tem de ultrapassar
as circunstâncias e ver para lá dos limites que os mandantes querem dele”.
23.05.2015 Joaquim Carreira Tapadinhas, Montijo
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