sábado, 7 de março de 2020


Já não se ficam pelas ameaças...


São frequentes as notícias de agressões a pessoal médico e docente nos respectivos locais de trabalho, e não se vê que os castigos sejam dissuasores; sou dum tempo e dum lugar em que os pais, sobretudo algumas mães com maridos emigrados, quando iam à escola era para pedir aos professores que dessem aos filhos o correctivo que merecessem, que “não lhas poupassem”; verdade seja dita que nem era preciso pedir, pois naquele tempo a maioria dos professores não esperava por licença para desancar.

Transcrevo de “Os Maias” um “divertido” apontamento:

“...O conde ainda não aparecera, detido decerto na Câmara dos Pares, onde se discutia o projecto sobre a Reforma da Instrução Pública. Uma das senhoras de preto fazia votos para que se aliviassem os estudos. As pobres crianças sucumbiam verdadeiramente à quantidade exagerada de matérias, de coisas a decorar: o dela, o Joãozinho, andava tão pálido e tão desfigurado, que ela às vezes tinha vontade de o deixar ficar ignorante de todo.
A outra senhora pousou a chávena, e passando sobre os lábios a renda do lenço, queixou-se sobretudo dos examinadores. Era um escândalo as exigências, as dificuldades que punham, só para poder deitar RR... Ao pequeno dela tinham feito as perguntas mais estúpidas, as mais reles; assim, por exemplo, o que era o sabão, porque lavava o sabão?...
A outra senhora e a condessa apertaram as mãos contra o peito, consternadas: E Carlos, muito amável, concordou que era uma abominação. O marido dela – continuava a dama de preto -  ficara tão desesperado que, encontrando o examinador no Chiado, o ameaçou de lhe dar umas bengaladas”.


Amândio G. Martins

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