quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Falar, hoje!

Não. Não vou escrever sobre fogos, incêndios, labaredas como línguas criminosas, infernos dos diabos, matas de mortes, florestas como teias, pinhais como punhais. Não. Para isso já temos especialistas de todas as cores e credos, equipados e fardados de explicações que enchem bibliotecas impensáveis. Eu não sou especialista em coisa alguma, e vou apenas debruçar-me sobre as almas, os rostos, as penas, as feridas, os lamentos, as dores do coração da gente vítima das tragédias que lhes bateram como carvões a arder, e das lágrimas vertidas que nos diminuem e envergonham por tão pouco lhes valermos. Eu quero juntar-me à desgraça com a minha lágrima que se demora presa ao canto do olho enevoado. Estou de rastos por me saber impotente para maior ajuda. E pensava eu, que pior do que houvera acontecido, seria impossível. Não. Afinal neste país, tudo o que está para ocorrer mal, irá acontecer mesmo mal. É a lei fatídica anunciada. E isso é que é o real retrato que se pode registar em qualquer suporte, que traduza arquivo e memória. Estamos sempre no fio da navalha. Ao mínimo abalo, à mínima onda, lá estamos nós soterrados por entre lâminas de sofrimento e afogados no desespero temido. As imagens são dolorosas e os rostos são angústia que incomoda e nos destrói. Os rostos que o coração esconde mas de onde os gritos se ouvem, são a grandeza da nossa pequenez. Uma data e mais outra demonstra-nos que uns quantos responsáveis que se passeiam por lugares de comando e administrativos de fato e gravata, alertam-nos que estão a mais nos lugares que ocupam e nos chocam. Estorvam, confundem, atrapalham a luta de quem combate, luta, morre para vencer o inimigo. Eles são reforço do inimigo à sombra do conforto e da demagogia. Eles só se mexem para enganar e fazer que fazem alguma coisa, sem no entanto contribuírem com acções que justifiquem o posto político oferecido, e o dinheiro que sacam por lá estarem. Eles são muitos e bem que podiam engrossar as tropas dos que combatem no terreno. Mas não. Eles são nomeados para o ar condicionado, e o único fumo que espreitam é o que sai dos charutos cohiba, e das luzes dos estúdios televisivos para onde são presença constante. Debitam discursos, teorias, queixas, conforme o que lhes dá jeito para apoiar ou atacar o poder. Eles são comandantes, presidentes, autoridades, cargo evidente em tudo quanto é prémio, salário ou avença, privilégio. Só não são, é solução para coisa nenhuma, faça sol ou chuva. Temos o diabo e o inferno em cada um, que se julga que sabe mais e melhor, do que o comum mortal, que se viu despojado dos valores e da vida!


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