Santana-Maia Leonardo - As Beiras de 4-6-2014
Voltou a ser noticiado, a propósito do endurecimento das medidas aprovadas pelos Advogados portugueses contra implementação do novo mapa judiciário, que estas têm a ver “com o encerramento de duas dezenas de tribunais e a redução de funções de outros 27”. Ora, isto não só é mentira como dito desta forma até é ridículo.
O encerramento de duas dezenas de tribunais e a redução de funções de outros 27 é, sem dúvida, preocupante para as populações servidas por esses tribunais mas trata-se de questão absolutamente lateral e pontual, sem qualquer relevância para a discussão de fundo. Basta ter em conta que muito mais relevante do que o encerramento de duas dezenas de tribunais e com muito mais impacto na vida das populações é a extinção de mais de duas centenas de tribunais de comarca, o que eu ainda nunca vi referido na comunicação social.
Em todo o caso, o que é verdadeiramente criminoso nesta inovação revolucionária (não lhe chamemos reforma, porque não se trata de uma reforma no verdadeiro sentido da palavra), é que a mesma tem subjacente o modelo de desenvolvimento de Portugal como “Lisboa, Cidade Estado”, modelo esse que não só nunca foi sufragado, nem referendado em nenhumas eleições como, inclusive, todos os partidos são eleitos com base na promessa de tornar o país mais coeso territorialmente.
Ora, a actual “reforma” do mapa judiciário representa o corte definitivo e irreversível da Cidade Estado de Lisboa com o interior do país, deixando as populações entregues à sua sorte e às suas leis, como se o território a leste da A1 não fosse Portugal e Lisboa achasse mal-empregado qualquer cêntimo aí gasto. Esta reforma é criminosa porque é racista. Divide Portugal definitivamente entre brancos e pretos.
Além disso, como todos sabemos por experiência própria, ao contrário das reformas, as inovações revolucionárias, porque partem sempre da construção teórica para a vida do dia-a-dia, não só nunca dão bom resultado como nunca dão sequer aquilo que era suposto darem. Sem esquecer, em tempo de “vacas magras”, que se trata de uma “reforma” extremamente dispendiosa, onde os custos iniciais são, logo à partida, muito superiores à poupança esperada, o que não indicia nada de bom em termos de contas finais. Infelizmente, quanto a este aspecto, também já sabemos o que a casa gasta.
Em todo o caso sejamos claros: o actual Governo não tem a mínima legitimidade democrática para impor, unilateralmente, uma revolução estrutural e fracturante da sociedade portuguesa desta dimensão, a poucos meses de terminar o seu mandato, após uma derrota humilhante nas eleições europeias e sem qualquer apoio na sociedade portuguesa, quer das forças políticas com expressão parlamentar, quer das forças políticas emergentes das eleições europeias, quer de instituições, associações ou organizações da sociedade civil.
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