O PÚBLICO de 7/1 traz um artigo sobre o estetoscópio, a que chama ícone da Medicina, nos seus duzentos anos existência, dizendo que ele "está no centro de um debate acerca do que deve ser a prática médica" (sic). Realmente não sabia que o "nosso querido estetoscópio" estava no cerne desse debate que foi bem patente no Congresso Nacional de Medicina realizado no passado Setembro no Porto sob o tema do Acto Médico, mas vou permitir-me dizer algumas coisas, a maior parte delas... brincando.
Quanto ao artigo, ele é claramente apologético do abandono da tal "ubíqua ferramenta dos médicos" (sic) e para isso socorre-se quase totalmente da opinião de cardiologistas, chegando um deles afirmar que "o estetoscópio morreu". Bem contrária é a "longa vida" prognosticada para o mesmo por um pediatra ( ah, grande colega!). Percebe-se bem a divergência pela abissal diferença entre um especialista de orgão e outro muito mais holístico em que "os pulmõezinhos e os intestinos" fazem parte integrante do todo dinâmico que vai a té aos 18 anos. Isto para além da parafernália instrumental que o primeiro tem e o segundo não possui no dia a dia do seu desempenho clínico. Mas a pergunta final do texto de Lenny Bernstein talvez seja capital: irá algum doente confiar em alguém que não lhe quer tocar?...
Não querendo parecer "o dinossauro que sou" mas antes o pediatra que existe em mim, deixem-me acrescentar que o estetoscópio serve ainda para três coisas, a saber : "dar satus", especialmente quando nos licenciamos..., descansar e reflectir enquanto o silêncio da auscultação dura ( a doente dum colega meu que adormeceu ao fazê-lo, perguntou-lhe se estaria muito mal já que ele se tinha "infirmado" tanto tempo...) e ainda, como comigo se passou na guerra colonial, se a "cabeça do aparelho" for bem pesada, como arma de defesa... Viva o estetoscópio!
Fernando Cardoso Rodrigues
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