Visitei a Eslováquia em 1998. A república Checa tinha há pouco
tempo “corrido” com este pequeno ainda não país, porque era a parte pobre que
os checos não queriam para si. Viviam os seus primeiros anos no “admirável mundo
novo” da democracia, ainda a medo, macambúzios, acossados pelos fantasmas do
passado.
A imagem mais forte que guardo desses dias - quase uma semana -
é do cinzento plúmbeo das paisagens dessa tentativa de país. A escuridão era
feita das sombras, das casas, das árvores, das pessoas, todo esse mundo a
esgravatar a medos procurando luz e uma esperança nova.
Angustiado pela asfixia de um tempo morto e pesado, escapei-me
para passar um dia em Viena. Fui de autocarro, acho que era o único meridional
presente e mesmo assim, quando chegados à fronteira austríaca, a polícia pôs
toda a gente cá fora, revistou o autocarro, apalpou os eslovacos, ficou-lhes
com os documentos para busca minuciosa de informação, e a mim, depois de
olharem para o meu passaporte que lhes mostrei na minha mão – sem ter saído da
minha mão – deixaram-me altivamente passar.
Ao fim do dia, no regresso, os guardas de fronteira eslovacos,
só me revistaram a mim.
Não fiquei com saudades de voltar a este país, apesar de ter
assistido a uma ópera no seu teatro que me arrebatou: o edifício e a qualidade
dos artistas. Todavia quando saí no fim da récita, o negrume abafou a minha
euforia.
Agora, quase vinte anos depois, a Eslováquia é membro de pleno
direito da União europeia e decidiu fechar as portas das suas fronteiras. Como
já é um país com uma democracia estabelecida, madura, consolidada, não aceita
no seu seio mendigos esfarrapados e fedorentos, atitude consonante até à
exaustão com o ideal da declaração dos direitos do homem.
Com isto não me queixo nem critico o povo eslovaco, consigo
ainda distinguir os cidadãos das pessoas que as governam, e infelizmente nem
sempre – ou quase nunca – estes estão ao nível dos primeiros.
Só tenho pena que um país que ainda não conseguiu varrer a
escuridão dos seus dias de sol encoberto, não tenha aprendido a soprar em
uníssono para afastar as nuvens e fazer clarear a luz.
Essencialmente é um texto muito bem escrito. Parabéns.
ResponderEliminarObrigado Afonso Cabral. Os meus cumprimentos.
ResponderEliminarÉ um bom comentário, com a profundidade de análise social, a que o Luís nos acostumou. O "Público" seleccionou-o para o inserir hoje (18.09.15) na respectiva secção. Mais uma vez, parabéns!
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