Estou muito contente e aliviado por a Hungria ter construído um
muro a envolver todo ou quase todo, o seu perímetro.
Contente por mim que assim não volto lá tão cedo: sou meridional
e o tom da minha pele saudavelmente bronzeada poderia trazer dissabores, apesar
do bilhete de identidade identificar-me como europeu, cristão crismado e
cumpridor das obrigações comunitárias.
Contente porque os
habitantes locais com mau feitio e ideias enviesadas, não vão poder sair desse
sítio maravilhoso, de boa vizinhança, e invadir a minha privacidade
visitando-me sem que os tenha convidado.
Contente porque o meu governo vai receber setenta milhões de
euros para alimentar e cuidar umas migalhas de milhares de refugiados que
andaram não sei quantos meses a calcorrearem não sei quantos de milhares de
quilómetros para acabarem num sítio sem dúvida lindo e solarengo, mas igualmente
mal avizinhado de gentes apáticas e sonsas e líderes finórios.
A primeira coisa que eles vão fazer quanto chegarem é começar a
organizar a sua nova fuga (vão ver que ainda vamos ter muros de arame farpado
na fronteira com a Espanha)
Aliviado porque os
refugiados que não são emigrantes por capricho mas por necessidade de
sobrevivência, já não podem lá entrar e poupam-se a aguentar a última dose de
vexame depois das aventuras divertidíssimas que viveram no longo passeio que
fizeram com os amigos, desde que saíram dos esplêndidos e arejados apartamentos
onde viviam, com vista para ruínas clássicas, antes de se lhes ter dado o
capricho, de se porem todos a caminho.
Aliviado porque as autoridades húngaras contêm assim as hordas bárbaras,
facínoras, assassinos terroristas do estado islâmico, que a coberto do disfarce
de pobres e ingénuas criancinhas que fingem que choram e que estão esfomeadas
de pão e de ternura, pretendem vir a semear o terror e o caos neste nosso
paraíso europeu, fraterno, igualitário e absurdamente livre.
Agradeço muito ao governo húngaro o facto de nos dar o gosto de
pertencerem à nossa bela união europeia e ao facto de serem agora os guardiões
da nossa fronteira democrática.
Envio o meu voto de apreço e muita – mesmo muita – compreensão,
ao povo que os elegeu, que ou se enganou ou estava bastante distraído.
Despeço-me desejando augúrios aos
líderes europeus e aos motoristas que os transportam do aeroporto a caminho das
suas reuniões de consenso no palácio da Europa em Bruxelas, pelos conselhos e
confidências (dos motoristas), que eles depois seguem fielmente (os líderes) e
a seguir dá no que tem dado.
Lá para Dezembro, vamos ter
fotografias belíssimas de criancinhas todas congeladas e hirtas, algures numa
planície qualquer, em trânsito para o paraíso.
Dois internos de um manicómio observavam a rua de um mirante que tinham na vedação. Dois sujeitos que passavam saudaram-nos, o que os encorajou a perguntar-lhes: "E vocês aí dentro, são muitos ?
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