quinta-feira, 3 de setembro de 2015

CRISE DA ALMA




Enquanto a Europa  assiste , meio impávida e preguiçosa, meio racista ou a querer parecer que não, à marcha fúnebre de seres humanos que procuram paz na sua vida, os Estados Unidos, longe - lá longe quando lhe convêm e perto quando quer meter a mão - apresentam com a pompa e circunstância da grande América, candidatos presidenciais como esse tal de Trump, que o nome em português até calha bem com a sua fonética muito próxima da trampa que ele representa.

Americanos - miúdos pequenos – armados em cavaleiros andantes, acodem desnorteados a chamamentos para causas que desconhecem, arautos do seu modelo civilizacional que presumem o melhor, e estragam ainda mais o que estava estragado. Depois, retiram-se como heróis e deixam o caos instalado.

Como um imenso oceano os separa das suas asneiras monumentais, frequentam  em família as suas praias, sem as inconveniências de lhes cair em cima do churrasco um corpo inchado, fedorento, picado pelas gaivotas, de quem tentou fugir do seu já não país, não porque deixou de o amar, mas porque deixou de o poder viver.

Esses, muitos - cada vez vão ser mais - batem agora à nossa porta e nós não estamos preparados para os receber com  sorrisos, porque também presumimos  que a nossa bolha de conforto está imune às infiltrações de um mundo que consideramos bárbaro (só porque as suas culturas não imitam a nossa).

Uns fingem que não ouvem e não vão atender, uns abrem a porta e deitam-lhes em cima os dejectos do dia, outros recebem-nos mas com “cotas”, porque nesta Europa padronizada, se há cotas para a sardinha e o leite, também as há (ou estão a caminho de ser  inventadas) para os refugiados. Como os vamos escolher não sabemos: pode ser pelo tamanho. Os que não cumprirem as medidas serão de novo deitados ao mar, para que cresçam...

Erguem-se de novo muros e arames farpados, chutam-nos à bastonada de um país para outro, num pingue-pongue abjecto nesta Europa cheia de pústulas.


Temos a ciência e a técnica mas elas não têm alma. Falta-nos uma alma melhor. Essa está dentro de nós, os trabalhos para o seu aprimoramento são internos, partem de  uma decisão individual, uma vontade corajosa de transformação do “Eu”. 

Isso é um trabalho solitário, mas só isso  pode transformar a forma e o modo como queremos viver como homens entre os homens .

9 comentários:

  1. Caro Luís Robalo,
    Como sempre foi com a maior atenção que li o seu texto. E pergunto: a corajosa transformação do "Eu" significa o suicídio, a destruição de todos os valores da nossa cultura que poderei resumir em igualdade, fraternidade e liberdade vividos em democracia? Certamente me dirá que não. E também pergunto: se a Europa está tão cheia de pústulas porque é tão cobiçada?
    A transformação de "Eu" deve ser uma dádiva ao outro mas não submissão ao outro. Deve ser a ajuda da elevação do outro e não o nosso rebaixamento à barbárie. Porque de barbárie realmente se trata quando falamos no Estado Islâmico. E o que acontece é que o terror que eles semeiam resulta muito eficaz. Assim, é por isso que eu digo que devemos ajudar e acolher mas temos de saber a quem. Apenas isto. Abrir as portas indiscriminadamente é criminoso e suicidário.

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  2. Caro Afonso Cabral,

    Obrigado pela simpatia de ter comentado o meu texto. Falamos no fundo do mesmo, com palavras diferentes. Abraço.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Desta vez, subscrevo na íntegra o texto do amigo Luís Robalo.O senhor Afonso Cabral fala, e bem, do terror do EI. Mas tem é que criou condições para ele se instalar? Quem destruiu os países desta imensa tragédia? Todos nós temos alguma culpa ao elegermos os governos que o fizeram: EUA e UE. Devemos receber esta gente de braços abertos

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  5. Caro Francisco Ramalho,
    Quero afirmar-lhe que pessoalmente não me sinto culpado de absolutamente nada. Repito: absolutamente NADA!

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  6. Pois eu sinto! E, apesar de, como calcula, nunca ter votado nos tais governos a que me refiro (sempre votei à esquerda do PS. Votei, voto, e faço campanha) sinto culpa por não me ter esforçado o suficiente para evitar que outros o façam. Embora também saiba que alguns, como deve ser o seu caso, nem abrindo-lhes a cabeça. Isto sem qualquer ofensa!

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  7. Caro Francisco Ramalho,
    Lamento que tenha contribuído de alguma forma para esta crise de refugiados/invasão. Lamento pelo sofrimento que lhe está a causar esta situação de que se sente culpado. Lamento que não me tenha querido ofender dizendo que nem me abrindo a cabeça eu perceberia. Lamento isto tudo, mas realmente na minha culpa ... ou falta dela mando eu.

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  8. Evidentemente! Cada um é como cada qual! Interessa é que estejamos de bem com a nossa consciência. Mas quanto a mim, sou-lhe sincero, estou longe de ser perfeito...

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