terça-feira, 8 de setembro de 2015

O rabisco


Passados que são 40 anos depois do 25 de Abril e com isto a andar para trás, convém lembrar às potenciais vítimas da propaganda dos saudosistas do 24 e do poder político vigente seu imitador, como era então a vida deste povo. Aqui vai um exemplo real: depois das colheitas nos latifúndios do Alentejo, sempre ficava qualquer coisa. Uns restos. Como as jornas eram miseráveis e só se ganhavam quando havia trabalho, e reformas ou qualquer apoio social eram utopias apenas para os mais esclarecidos, os velhos, as crianças e os desempregados iam então, ao que se chamava, o rabisco.
Um dia, andava a minha mãe com o meu irmão mais velho ao rabisco da azeitona, finava-se a tarde, o imenso olival não tardava ficar envolto na escuridão, e os saquitos longe de estarem cheios. Até que a minha mãe disse ao meu irmão para ir depressa acabar de encher o dele a uma oliveira das que ainda não tinham sido apanhadas, que ali estava, de pernadas baixas, carregadinha de azeitona. Em má hora o fez. O guarda que estava escondido, à coca, logo apareceu. A minha mãe seria multada. Como nem pouco mais ou menos tinha dinheiro para pagar a multa, iria para a prisão. Com quatro filhos menores, imagine-se o drama. Depois de ralhar com o meu irmão e de mentir ao guarda dizendo que não o tinha mandado “roubar” e de lhe implorar que não fosse fazer queixa à GNR , o guarda mantinha-se inflexível. A minha mãe decidiu então ser mais convincente. Agarrou numa vara e pôs-se a zurzir o filho. Este, embora uma criança mas já com a duríssima experiência da vida, não desmentiu a mãe, cerrou os dentes, e colaborou. Passado um bom bocado, o guarda lá disse: “ bem, deixe lá já o moço, mas para a próxima não se safa!”
Eu era um menino, mas ficou-me gravado na memória, depois, em casa, a minha mãe lavada em lágrimas a esfregar com álcool as roxas nádegas do meu irmão, beijando-o e soluçando: meu rico filhinho! Meu rico filhinho!
Francisco Ramalho
Corroios, Abril de 2014


PS- dedico este texto ao operário apenas com a 4ª classe( como ele diz) Arlindo Costa, e aos companheiros aqui de escrita,nomeadamente pelas suas ultimas tomadas de posição; Mário Jesus, Ricardo André, Céu Mota, Luís Robalo, Joaquim Tapadinhas, José Amaral, Amândio Martins (Górgias), Afonso Cabral e aos restantes democratas.



29 comentários:

  1. Quero publicamente agradecer a sua tão grande generosidade para comigo, decerto e com toda a modéstia e sinceridade, talvez eu não mereça tanto. Contudo ficará para sempre registado no meu "ego" a sua homenagem. Obrigado.
    E as maiores saudações democráticas, para todos aqueles que ainda querem acreditar na democracia.
    Um fraternal abraço do,
    Mário Jesus

    ResponderEliminar
  2. Caríssimo Francisco Ramalho,
    De facto nós somos nós e as nossas circunstâncias como bem disse Ortega y Gasset. A história da sua mãe e do seu irmão comoveu-me e calou fundo no meu coração. E o facto de também a mim a ter dedicado ainda mais. Obrigado.

    ResponderEliminar
  3. Meu Caro Francisco, li como muita atenção a sua verdadeira, crua e dura história do 'rabisco da azeitona' por parte de sua mãe e do seu fustigado irmão mais velho. Esses tempos eram duríssimos. Hoje em dia, vejo milhares de azeitonas calcadas e pisadas nos caminhos da minha aldeia e gente mais gorda do que odres cheios a não fazer nada de nada, enquanto os homens se embebedam sem cessar.
    No meu mundo campesino - no Douro - lembro-me de ir apanhar azeitona num terreno que dava para uma estrada, antes que os carros

    passassem, ou a chuva levasse as azeitonas pelo berma fora. E o termo 'rabisco' de ser e bem 'rebusco'. Ir ao 'rebusco' de, isto é, respigar frutos que ficaram depois das colheitas. Hoje, o desperdício dava para manter a fome de outrora.

    ResponderEliminar
  4. O meu anterior texto não saíu como queria, e a parte final era bem o seguinte: E o termo 'rabisco' deve ser e bem 'rebusco'. Ir ao rebusco de, isto é, respigar, apanhar frutos que ficaram depois das colheitas. ......

    ResponderEliminar
  5. "dedico este texto ao operário apenas com a 4ª classe( como ele diz) Arlindo Costa, e aos companheiros aqui de escrita,nomeadamente pelas suas ultimas tomadas de posição; Mário Jesus, Ricardo André, Céu Mota, Luís Robalo, Joaquim Tapadinhas, José Amaral, Amândio Martins (Górgias), Afonso Cabral e aos restantes democratas."

    Todos os nomes acima citados são estalinistas fanáticos ou colaboradores e apoiantes de estalinistas.

    A única coisa que eu não percebo é porque é que são tão tolerantes com confessados social-fascistas e apoiantes de um homem que nunca teve nada de democrata e foi um dos maiores criminosos contra a humanidade que já pisaram a terra.

    Nunca acharam estranho não haver um único esquerdista neste blog a proferir uma única palavra a denúnciar os terríveis crimes de Estaline?

    Não acham hipócrita (para dizer o mínimo...) que ataquem tanto Salazar, mas que nem por uma única vez abram a boca em relação a Estaline?

    Será que ninguém neste blog consegue ver estas contradições absolutamente hipócritas e insustentáveis?

    Para além de mim, não vi ainda um único membro deste blog ter a coragem de dizer estas verdades que têm de ser ditas.

    Agora sou eu próprio que começo a pensar em sair deste blog se isto continuar assim, pois nunca gostei de cobardes e gente falsa. Podem até não gostar de mim, mas o vosso silêncio em relação aos horríveis crimes do Comunismo e a vossa tolerância extrema para com estalinistas da laia do Arlindo Costa, entre outros, é uma autêntica vergonha e é cuspirem em cima da memória dos milhões de homens, mulheres e crianças inocentes que foram trucidados por essa ideologia sanguinária.

    Deviam de ter vergonha, todos vocês...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O sr. Nobre já se colocou de fora, demarcando-se de todos nós, apelidando-nos de nomes que eu nem sei o que significam ... enfim.

      Eliminar
    2. Sr. Horta Nobre, o que tenha feito Estaline (um ditador do pior, evidentemente) não está em discussão. O que está em discussão é algo bem mais simples: o Sr. Horta Costa é incapaz de falar sem usar de agressão e de generalização.

      Eliminar
    3. Este comentário foi removido pelo autor.

      Eliminar
    4. Este comentário foi removido pelo autor.

      Eliminar
    5. Sr. Nobre, faça juz ao seu nome e por uma vez que seja, ponha-se no lugar dos outros. Imagine que nasceu, por exemplo, na Síria e se encontra na situação de refugiado. Procura asilo e acolhimento noutro país em paz e não lho dão. Gostaria de ser rejeitado?
      Eu não colaboro com a «superclasse mundialista». Nem sou «fanática». Agradecia que não me rotulasse como se fosse uma garrafa ou pacote ou objecto qualquer. O senhor não conhece o conteúdo e rotula todos e tudo. Só espero que tenha percebido a minha opinião em relação ao senhor e à sua continuação neste espaço que sonhei e imaginámos sem estes dissabores...

      Eliminar
    6. Os refugiados têm muitos países ricos no Golfo Pérsico para onde podem ir pedir asilo. A Arábia Saudita, o Qatar, os Emirados Árabes Unidos, são todos países muçulmanos e riquíssimos em petróleo e até agora não fizeram qualquer esforço para acolher refugiados. Atiram o problema para cima da Europa e nós é que os temos de aturar.

      Os refugiados têm muitos países muçulmanos para onde podem ir, mas querem vir para a Europa à procura da mama dos subsídios. A minha posição em relação a esta questão não se vai alterar. Não quero refugiados do Médio Oriente em Portugal, nem um único refugiado e da minha parte farei tudo o que puder para impedir que essa gente venha para cá e se vierem, continuarei a fazer tudo o que puder para os recambiar de volta para o sítio de onde vieram o mais depressa possível.

      A única excepção a abrir será para os cristãos.

      Em lugar de a Maria do Céu se indignar comigo, indigne-se é com quem arranjou esta barraca toda para começar, nomeadamente os tais "democratas" que arranjaram desnecessariamente todos esses conflitos no Médio Oriente.

      Eliminar
  6. Força, senhor Francisco Ramalho! A vida é dura, mas é mais dura para quem é mole. Por mim, já vivi muito para me impressionar o troar dos cascos da burricada desencabrestada.

    ResponderEliminar
  7. Merece sim, Sr,Mário! Evidentemente, com uma excepção, tocou-me muito as palavras de todos. Um grande abraço amigos e amiga!

    ResponderEliminar
  8. Respostas
    1. Sr. João José Horta Nobre,
      Peço-lhe que não se vá embora deste blog. Não imagina o que me tenho divertido. O Sr. é verdadeiramente estimulante e a sua energia invejável. Há muitos anos tive um cão muito melhor do que a sua cadela Pastora Alemã. Era muito melhor e vou-lhe dizer porquê. Por dois motivos importantes: o primeiro motivo é que como era completamente rafeiro tinha muitas raças e a sua só tem uma; o segundo motivo é que não era da mesma raça daquela muito acarinhada melo monstro nazi Adolfo Hitler como é o caso da sua. Já imaginou que a sua cadela pode descender dos cães de Hitler? Só a remota possibilidade genética o devia incomodar. Quanto ao Estaline parece que não tinha cães de estimação, excepto o Khruschef.

      Eliminar
    2. Este comentário foi removido pelo autor.

      Eliminar
    3. Sempre o tratei por Sr. mas se assim preferes passo a tratar por tu. Já eram duas da manhã quando fez este comentário e por isso não deves ter lido bem o meu pois já devias estar cansado. O que eu disse foi que em minha opinião (obviamente discutível) o cão que tive era melhor do que a tua cadela. Primeiro porque tinha muitas raças em vez de apenas uma e depois porque a tua cadela é da raça dos cães que o Hitler mais estimava. Tens alguma dúvida de que o Hitler era Nazi?
      É verdade, cumpri o Serviço Militar em Angola, Escrevi um pequeno livro sobre o assunto intitulado TEMPO FLUTUANTE. Caso estejas interessado terei muito gosto em te oferecer um exemplar. Só preciso que me mandes a tua morada. Caso prefiras podes adquiri-lo aqui:http://www.wook.pt/ficha/tempo-flutuante/a/id/1457570

      Eliminar
    4. Este comentário foi removido pelo autor.

      Eliminar
    5. Coitadinha da criatura está a ser vitima da liberdade de expressão !

      Eliminar
    6. Pois perdes qualquer coisa em não o leres. É que o livro é uma grande denúncia da miserável descolonização que fizemos. Eu estive lá e vi.
      Assim sendo como é que podes ter razão ao afirmares "livros que apoiam a descolonização exemplar"? Estás a ver como és desrazoável?

      Eliminar
  9. Embora ache que a minha opinião não pesa nada para isto, também defendo que não se vá embora...De facto, conhecendo já todos a forma como a cavalgadura dá o coice, e, no caso em apreço, atira com as duas patas traseiras em simultâneo, é só manter aquela distância profilática...

    ResponderEliminar
  10. Caro Francisco Ramalho, já tinha uma imensa admiração pelo amigo, mas, depois, do que conta sobre a sua terrível experiência do "rabisco", ainda mais se acentuou essa minha admiração. E sabe porquê, é porque, também eu, sei o que foi enfrentar a "justiça" de um regime que além de hipócrita era desumano para com aqueles que não nasceram num berço de ouro e que para sobreviverem ás vezes tinham de furar as leis, como esta que: obrigava a ter licença de venda ambulante, mas que não permitia ao vendedor, parar para a venda pesagem da fruta que eles (Salazar e seus comparsas) diziam ser a bem da Nação. Quanto à honrosa referência que o Francisco me faz, quero agradecer-lhe do fundo do coração, comoveu-me até quase ás lágrimas. Obrigado amigo. Entretanto, para perceberem porque me comovi também com o texto do "rabisco ", vou talvez ainda hoje, contar neste blogue, algo que se passou comigo e com a minha querida Mãe, teria eu aí uns oito anitos de idade. Um abraço a todos os que se identificam com Abril de 1974 e com os sentimentos humanistas.

    ResponderEliminar
  11. Ao João José Horta Nobre: então eu, José Amaral, também sou mais um ESTALINISTA FANÁTICO? Tenha tento no que escreve porque é muito feio mentir dessa forma. Não gosto de ser insultado por quem nunca ofendi.

    ResponderEliminar
    Respostas

    1. É precisamente neste ponto que o senhor José Horta perde a razão, e acredite que me custa dizer-lhe isto. Há pessoas neste blogue que efectivamente não são merecedoras das suas generalizações. Mas também quero que fique bem claro que entendo perfeitamente, por experiência própria, que há quem mereça. E só para lhe dar dois exemplos de pessoas que não merecem, e haverá outros, os companheiros José Amaral e Afonso Cabral são pessoas duma delicadeza acima da média. Peço-lhe que me compreenda pois ao dar-lhe esta opinião é para que medite evitando ser injusto.

      Eliminar
    2. Este comentário foi removido pelo autor.

      Eliminar
  12. Obrigado, companheiro das palavras escritas. Não é de bom tom insultar para manter a 'sua'- de qualquer um - posição. Ou se aceita, ou não se injuria.

    ResponderEliminar

Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.