Agnóstico que sou, não me repugna o verdadeiro prazer que
tenho ao elogiar os que estão do outro lado da barricada religiosa - sobretudo
os católicos, talvez por me estarem mais próximos. Apetece-me gritar aos quatro
ventos a satisfação que me deu ler, nas páginas do Público, a crónica dominical
de Frei Bento Domingues (FBD). Desmistificar com clareza o que tantos e tantos apregoam
com palavreado rebuscado é apanágio de FBD. Põe o dedo nas feridas, mesmo que a
alguns, com grandes responsabilidades, possa doer. Mas como é bom lembrar que a
propriedade privada tem uma função social e que não é uma verdade absoluta de
todos os tempos, havendo realidades que lhe são anteriores! A pobreza foi
sempre um tema de eleição para os cristãos. Da prática inicial, de cariz
caritativo e, sobretudo, de justiça, foi-se passando, com os tempos, para a
teoria do “olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço”. Novas regras
se foram arraigando nas consciências, assim se legitimando a apropriação por alguns
dos bens de todos, primeiro pela superioridade imposta pela força, mais tarde
por um pretenso direito que o “saber” forjado e adquirido valida. Quem, hoje,
se atreve a questionar as leis dos famosos mercados? No entanto, Jesus expulsou
do templo os vendilhões que por lá pululavam. FBD assinala que é para o
pobre que devem ser dirigidos os sentidos
da economia e da política. Todos reconhecemos que, na realidade, as coisas não
são assim, e FBD sinaliza, assertivamente, a traição aos valores fundacionais.
Cometida por aqueles que estão dominados pela ânsia do poder, de soberba imensa,
chegando ao ponto de acreditar que serão eternamente impunes.
Cuidado, não o são. Vem-me à memória o Barqueiro de
Constância, de Alexandre O’Neill: “E com a fome ninguém se meta”.
PÚBLICO, 03.05.2015
PÚBLICO, 03.05.2015
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