terça-feira, 28 de abril de 2015

O naufrágio da esperança

Tinha 9 anos, quando rebentou a guerra em Angola.  Cresci ouvindo dizer que todos os males de África eram a colonização. Pois que nos viéssemos embora, aquilo não servia para nada, só para meia dúzia do governo fazerem grandes fortunas à custa da exploração desenfreada dos indígenas.
Ouvia isto da boca do povo. Grandes almas políticas, na altura no exílio, doutrinavam o mesmo ponto de vista, desde a Argélia às belas ruas de Paris.
Na faculdade, forças políticas bem organizadas mobilizavam, com grande sucesso, o espírito rebelde da juventude em torno do mesmo objetivo.
Um dia, perguntei ao meu avô: Avô, tu foste inspetor do caminho de ferro de Benguela durante 35 anos! Porque é que  nós não somos ricos?
Fez-se a descolonização por toda a África. Finalmente, os colonos foram expulsos e os povos africanos, alcançaram  a sua autodeterminação, a independência e a liberdade.
Meio século depois, que notícias nos traz diariamente a comunicação social? A de centenas de africanos que constantemente arriscam a vida, na tentativa  de  chegar à europa pelos meios mais precários  - ainda recentemente foram mais de 700 os que morreram de uma assentada! E o que dizem agora os grandes paladinos da liberdade que durante anos gritaram pela independência dos povos africanos, pela autodeterminação, chegando a afirmar (ouvi dizer…) que os colonos atiravam-nos aos tubarões? Ainda bem que o não fizeram; é que além de ser provavelmente injusto, não me admirava que os emigrantes desesperados se atirassem propositadamente ao mar.

Dinis Carmo 

2 comentários:

  1. Caro Dinis Carmo, companheiro de blogue,
    Compreendo e partilho o seu desgosto pelos sucessivos desastres na travessia do Mediterrâneo. Mas não partilho das suas crenças quanto às causas do que se está a passar, sobretudo no que se referem ao exílio de tantas populações (não só africanas nem provenientes de ex-colónias). Esses povos fogem à miséria, sim, mas também à guerra. Guerra esta que lhes foi “vendida” pelo Ocidente. A exportação das democracias ocidentais para os países-cobaia, em especial o Iraque, a Síria e o Líbano, não falando do Afeganistão, deu isto. Não seria exigível que tantos conselheiros e decisores dos Governos americano, francês e inglês, previssem que financiar e ajudar certos grupos (Al Qaeda e outros), na sanha de derrubar alguns ditadores, acarretaria males enormemente maiores?
    Ainda bem que reconhece que a contestação estava na “boca do povo”. Vox populi, vox Dei… É verdade que muitos dos que escolheram ou se viram forçados ao exílio, passearam-se nas “belas ruas de Paris”, mas nem todos viviam à grande. Eu, por acaso, fui dos que escolheram ficar. Mas, afinal, não me deixaram ficar, mandaram-me para a Guiné sem me pedirem opinião, durante dois anos que, aliás, considero terem sido roubados à minha vida. Também não vim de lá rico. É que as colonizações – e explorações congéneres – não se exerceram só sobre pretos e nativos. O seu avô, provável e infelizmente já não entre nós, bem o poderia confirmar, se pudesse.

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  2. Amigos deste nosso espaço que do Céu nos foi dado: eu também estive na Guerra Colonial, precisamente na Guiné, a apodada Vietname Português. E sempre respeitei, penso que sim, os que lá estavam. Todavia, os militares mais boçais, é que não tratavam lá muito bem as gentes de lá. Considerei-os iguais a mim e não me arrependi.
    Todavia, o que se está a passar no Mediterrâneo é o resultado da muita sobranceria das más políticas e dos homens que fabricam armas, em vez de pão, apesar de 'nem só de pão vive o homem'. Olhemos o semelhante como nosso irmão.

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