domingo, 23 de fevereiro de 2020

Vasco Pulido Valente


Quem pode não lamentar a morte de Vasco Pulido Valente? É uma perda, uma morte - ninguém lhe escapa - a ser sentida pelos pares, os que ainda aqui ficamos. A dor pela partida de um de nós justifica que se obscureça parte relevante da memória que nos fica? Ficaremos condenados a suavizar a pena sentida com elogios fúnebres de grande exaltação? 
VPV tinha imensas qualidades. Escrevia como ninguém, beneficiava de uma enorme inteligência, possuía uma cultura vastíssima, esbanjava coragem, era um incansável trabalhador. De tudo isto, beneficiámos todos no prazer (ou irritação...) que os seus textos nos despertavam. 
Mas VPV possuía outras características que, para mim, nesta hora de dor nacional, não devem ser escondidas. Profundamente vaidoso e arrogante, insolente e cínico, misantropo até à medula, não se coibia de, orgulhosamente, insinuar o seu próprio mau feitio como qualidade só de “deuses”. E ele, que criticava tudo e todos, sem braga nem amarra, era portador de susceptibilidade fortemente irritadiça. 
Apesar de tudo, honra a VPV pelo brilho que irradiou. Mas ele, que abominava as convenções, foi tudo menos o que convencionámos chamar de um “bom homem”. Estou tranquilo: ele diria de mim coisas muito piores.  

Expresso - 29.02.2020 (amputado das partes sublinhadas).

1 comentário:

  1. A isto, chama-se ISENÇÃO. Nem sempre os "nossos" são os melhores o os "outros" os piores.

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