”Calaçaria militante”...
Quando era miúdo havia aqui três irmãos já velhotes,
solteirões, que viviam juntos na casa herdada dos pais; dois homens e uma
mulher, mais nova, que se ocupava da casa, dos animais pequenos e cozinhava
para todos; o mais velho, muito pitosga, pouco fazia, ficando para o do meio
todo o trabalho da lavoura e cuidar do gado grande.
Como pouca ajuda podiam ter da comunidade, porque eram um
bocado avarentos e também não podiam ajudar a vizinhança, o escravo da casa,
apesar de não lhe sobrar tempo nem para se coçar, tinha sempre as culturas
atrasadas e mal amanhadas; perante a evidência e os comentários, a mulher
desabafava que não podia, Chico não via e só Zé é que fazia alguma coisa, mas
ele era um calaceiro; o “desinfeliz”, a quem era exigido que desse conta de
toda a lavoura da casa, como agradecimento ainda levava uma roda de calaceiro!
Coisa diferente parece ser o que se passa com um juíz
desembargador da Relação de Coimbra, que processou um advogado por este lhe
chamar calaceiro em letra de forma, qualificativo que parece ajustar-se mesmo
ao comportamento do magistrado; de facto, pelo que se lê no JN, o desembargador
teve o desplante de declarar por escrito ter tomado uma decisão que implicou a
prisão preventiva de um arguido sem ter lido sequer a documentação que lhe
estava apensa, pelo que o advogado, agora na qualidade de réu, reafirmou que
não tirava uma vírgula ao requerimento em que acusava o magistrado de
“calaçaria militante”...
Amândio G. Martins
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