sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Ainda o 25 de Novembro


Agora que já passou, confesso que não comemorei o 25 de Novembro, não porque, segundo Ramalho Eanes, citado no artigo de Irene Flunser Pimentel no PÚBLICO de 25/11, “os momentos fracturantes não se comemoram”, mas por outros motivos que tentarei resumir.

Nunca partilhei do receio que invadiu muitos de que se estaria a preparar a instauração de um regime comunista/totalitário em Portugal. O próprio PCP, nesse mesmo dia, confirmou ao Presidente Costa Gomes “que não mobilizaria os seus militantes para qualquer acção de rua”, e alguém, em juízo perfeito, acreditaria ser possível instalar-se, naquele ano, uma Cuba na Europa? Tenho sido repetidamente ingénuo ao longo da vida, mas não tanto assim. Melo Antunes rapidamente deu conta do seu avisado pensamento. O “perigo” útil, glosado, ainda hoje, até às entranhas, foi, na realidade, muito bem “fabricado”, e encontrou terra fácil para germinar. 

Sabemos, entretanto, que, coincidentemente ou não (e verdade se diga que não só em Portugal), desde aí, a repartição dos rendimentos entre o Trabalho e o Capital tem vindo a revelar crescentes desequilíbrios em favor do segundo. Alguma defesa de direitos das pessoas que, como eu, descendem, foram, e pertencem à classe trabalhadora, vem daqueles que, há 45 anos, segundo se diz, nos queriam comer as criancinhas e matar os velhos. 

É sempre bom lembrar o Gulag, mas sem que se esqueça Auschwitz, o Tarrafal, os campos de reeducação chineses e os de concentração americanos para os “japs”. Ai esta natureza humana...


Público - 29.11.2020

14 comentários:

  1. Ocorre-me a velha frase de que, em política, o que parece é; e o que naquele tempo parecia, com cercos violentos à sede de partidos políticos, à sede da democracia que dava os primeiros passos, e tantos outros episódios que nada de bom auguravam, aquela intervenção não tem de que se envergonhar. E se é verdade que não seria fácil instaurar por cá novamente um regim totalitário, as tentativas para o conseguir podiam certamente causar muito dano, no que até aí tinha decorrido praticamente sem sangue...

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    1. Nisto do laboratório da História, todos ralham e…
      Lembro-lhe que os cercos às sedes dos partidos foram, na época, maioritariamente aos de esquerda. Era o Verão quente, da “fronteira” de Rio Maior, com desmandos, literalmente à esquerda e à direita, quer dizer, a eito. Pouco depois do ELP...

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    1. Na lógica de organização do blogue, o seu comentário ( não resposta) pareceu-me dirigido ao José Rodrigues. Foi ou era resposta/comentário ao Amândio Martins?

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    2. Agora, sou eu que digo: “bem observado”.

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    3. Ao Fernando Rodrigues: tem razão. O meu comentário foi tão curto que mais parece uma resposta ao Amândio.
      Ao José Rodrigues: referindo-me apenas ao último parágrafo, em que fala sobre o Gulag e os campos de concentração americanos, aproveito para lembrar que Portugal, ao fazer parte da NATO, está a dar cobertura a um dos responsáveis por essas patifarias. A NATO não é uma força dissuassora, como nos querem impingir, mas sim uma força agressora, como ficou provado na intervenção dos Balcãs.

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    4. Como discutíamos o 25 de Novembro e o José Valdigem "meteu" a NATO pelo meio, dá-me então ensejo e direito de lhe perguntar: o que pensava então do Pacto de Varsóvia?.
      E, voltando ao tema do 25/Nov, concorda ou não que o PCP, tentou ( até onde pôde) a instalação dum regime comunista em Portugal? É que fiquei sem saber qual é a sua visão sobre isso...

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    5. No meu comentário está implícita a minha posição quando classifico como "essas" patifarias e não "essa". Nem NATO nem Pacto de Varsóvia.
      Aplaudo o 25 de Novembro com o mesmo entusiasmo com que aplaudo o 25 de Abril. Este, não se fez para instaurar uma nova ditadura. Relembro sempre o Grupo dos 9 e o seu mentor (Melo Antunes), os fascistas, como então lhes chamava o PC.

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  3. O seu texto fez-me "saber" que "não estou (estive) no meu juízo perfeito" pois se calhar - e só a título de exemplo - se calhar Vasco Gonçalves nem sequer existiu... E "bater no peito" porque "acreditei" que as crianças eram o "pequeno almoço dos comunistas...
    Mas felicito-me por entender que me lembro muito bem de Auschwitz, tanto quanto me lembro do Gulag. E do Tarrafal. E dos "japs, bem como de Pearl Harbour...
    Como diz o José, ai esta natureza humana... que temos que corrigir com escolhas pessoais entre os diversoso valores.

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    1. Não quis chamar “maluquinho” a ninguém. A minha frase pode não ter sido muito feliz, mas mantenho que o “juízo” (opinião) que maioritariamente se fez, na altura e ainda hoje, é claramente “imperfeito”, baseado em muito do que, hoje, classificaríamos sem hesitação como fake new. Coisas do politicamente correcto, eivadas de preconceitos que me custam a compreender.
      Tal como o Fernando, também me felicito. Mas por não ter sido desmentido nos factos que citei. Quanto aos “juízos” que sobre eles fazemos, todos somos - e muito bem - completamente livres, pelo menos até ver. E quanto a escolhas pessoais, asseguro-lhe que as faço e que continuo muito satisfeito com elas.

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  4. Perdoe-me o José mas, neste importante assunto que estamos a debater, esqueci-me dizer algo que reputo de interesse para refutar o que aduziu no seu texto. Em jeito de pergunta. Acha mesmo valorizável o que aduz de "o próprio PCP, nesse mesmo dia,confirmou ao presidente Costa Gomes que não mobilizaria os seus militantes para qualquer acção de rua" (sic)?! O que queria que fizesse?! " Dois passos à frente, um atrás"...

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    1. Eu não aduzi nada. Se reparar bem, coloquei aspas na expressão. Ela é do texto de Irene Pimentel. Tanto quanto sei, reproduz a verdade dos factos.
      Valorizável? Se o não fosse, porque é que o Presidente da República teria contactado Álvaro Cunhal? Claramente para obter dele esse compromisso. Que, de resto, obteve.

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  5. Ainda me lembro bem do que foi o famigerado "verão quente", com ocupações e saneamentos selvagens, actos que levaram à destruição de muitos postos de trabalho; e das declarações do grande chefe de cabelo branco e sobrancelhas pretas, que nunca perdia oportunidade de afirmar, mesmo a órgãos de informação estrangeiros, que em Portugal nunca se instalaria aquilo a que chamava "democracia burguesa", como se houvesse muitos variantes de democracia e esta fosse algo que se pudesse servir "a la carte"...

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    1. Contudo, mesmo sem ser preciso abdicar do direito de opinião, a História não se faz (não se deve fazer) pela metade.

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