A sorte dá muito trabalho...
...É a resposta que os bem sucedidos na vida costumam dar
quando lhes dizem que têm sorte, mas há nisto um grande fundo de verdade;
andava a trabalhar na horta quando o meu conterrâneo Cachada veio ter comigo
para lhe dar couves de plantar, que me sobram muitas no alfobre; à distância “regulamentar”,
fomos falando da situação que se vive e da “sorte” que temos de ainda não haver
por cá ninguém infectado mas, dizia o Cachada, há muita gente a “pirar”,
sobretudo os empregados no comércio e indústria, que os do campo não lhes falta
com que se entreter.
De facto, sem feiras, sem festas, sem trabalho, e ainda por
cima sem futebol para descarregar o tédio, que há muita gente que, extra
trabalho, não tem outro assunto de conversa que não seja a bola, até meio da
semana o jogo anterior, daí para a frente o próximo, há por todo o lado uma
situação “explosiva” em termos psiquiátricos, que é preciso haver quem saiba
gerir, que também não há muito.
Mas voltando à “sorte”, falava-se ontem na TV espanhola La Sexta do “exemplo” de Portugal,
com menos mortos até hoje do que muitos países sofrem por dia, incluindo
Espanha, embora já muito melhor; numa ligação a Enrique Oltra, seu correspondente em Lisboa,
a jornalista Mamen Mendizábal perguntava-lhe como conseguem os portugueses tal “performance”,
tendo ele respondido o que todos sabemos: trégua no combate político, concentração
no que é mais importante, disciplina dos portugueses e também alguma sorte.
Quanto ao futebol, a que Alberoni chama “uma metáfora da
vida”, transcrevo um pouco do que diz no livro cuja foto anexo: "Alguns defendem que o futebol não dá nada,
que seria apenas um jogo de emoções, uma embriaguez fantástica, um desabafo dos
instintos; mas os sociólogos e psicólogos, pelo contrário, defendem a tese de
que o indivíduo tem necessidade de esquecer a sua própria identidade, de se
fundir com o colectivo. No estádio todos são iguais, explodem em excessos,
gritam, abraçam-se, fundem-se para formar um poderoso organismo
superindividual. Depois, em casa, cada um regressa a si mesmo, à vidinha de
todos os dias”.
Amândio G. Martins
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